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Crítica
1 de Junho de 2009   Filosofia política

Contra o autoritarismo

Aluízio Couto
A Volta do Idiota
de Plínio Apuleyo Mendonza, Carlos Alberto Montaner e Álvaro Vargas Llosa
Odisséia Editorial, 2007, 238 pp.

No parágrafo de encerramento do Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano, Plínio Apuleyo Mendonza, Carlos Alberto Montaner e Álvaro Vargas Llosa sentenciam com certa tristeza a própria derrota perante a idiotice ideológica que se espalhara na América Latina. Disseram isso há treze anos. Infelizmente, não poderiam estar mais certos. A parte final dos anos noventa e os primeiros anos após a viragem do século presenciaram um retorno vigoroso dos populistas de esquerda nos países latinos. As velhas bravatas nacionalistas, antiamericanas e anticapitalistas estavam de volta. E não é que o povo acreditou na conversa? Como consolo, a trinca de ases que assinou o Manual não deixou os acontecimentos passarem como um ônibus que não pára no ponto. Com a mesma pena crítica e ao mesmo tempo divertida lançaram no mercado, em 2007, A Volta do Idiota.

Novos tempos, novos idiotas. Antes tínhamos Fidel Castro como protagonista. Agora temos Hugo Chávez no papel capital. O presidente venezuelano é a personagem principal de A Volta. Descrito pelos autores como o “melhor aluno” de Castro, Chávez reúne com destreza as características que um idiota exemplar deve conter. Para azar dos venezuelanos, o autoritarismo figura entre tais características. Segundo A Volta, no ano de 2004 o presidente venezuelano aprovou de maneira inconstitucional o aumento de 20 para 32 cadeiras no Supremo Tribunal de Justiça. Evidentemente, a medida acarretou uma maioria favorável a Chávez no judiciário. Nem fez questão de disfarçar: assim que o magistrado eleito para presidir a corte tomou seu posto, declarou que “todo juiz que emitir julgamentos contrários aos princípios revolucionários será destituído e sua sentença anulada”.

Aparelhar o judiciário pareceu não bastar. Os delírios do simpático presidente causaram uma verdadeira confusão na economia daquele país. O livro nos conta que a ingerência econômica de Hugo Chávez provocou uma desvalorização de astronômicos 292% na moeda venezuelana em um período de apenas sete anos. Não se pode negar que é uma marca verdadeiramente prodigiosa. No mesmo período, o México teve uma queda de 16% (marca insignificante perto da venezuelana). Pelo visto, não dá para colocar a culpa nos EUA. Com uma economia em frangalhos, a Venezuela ficou em situação desfavorável para resolver problemas graves como a pobreza.

Com uma sacada inteligente, o trio de escritores divide a esquerda latino-americana em duas principais frentes: vegetariana e carnívora. A primeira pode ser descrita como um esquerdismo moderado, atento às demandas da economia mundial, respeitosa dos mercados e avessa ao radicalismo jurássico dos barbudos furiosos da velha guarda. O principal exemplo dessa esquerda serena é a presidente do Chile Michelle Bachelet. Com uma gestão predominantemente liberal, Bachelet ajudou o país a conquistar índices cada vez melhores na economia (aumento da produção) e na área social (redução da pobreza). Já a esquerda carnívora, capitaneada por Hugo Chávez, Rafael Correa e Evo Morales, parece ainda rezar na cartilha dos tempos da Guerra Fria. Presa em uma espécie de radicalismo anacrônico, desconfia de tudo que tenha cheiro de livre mercado, livre iniciativa e abertura ao capital externo.

No decorrer da obra, os autores nos mostram exemplos de países que conseguiram prosperar com um programa responsável de reformas políticas e econômicas. Em uma análise curta (porém cuidadosa) do que fizeram Espanha, Irlanda, o já citado Chile e alguns outros, a nossa trinca de ases argumenta que é possível o desenvolvimento adotando um modelo honestamente liberal. Indo, portanto, na contramão do ideário quase elevado ao posto de evangelho em nossas terras.

Por fim, a leitura de A Volta do Idiota nos faz questionar certos dogmas repetidos até a exaustão nos círculos pensantes da América Latina; como o Manual, provoca a reflexão sobre nossos próprios erros ao longo da história. Para deixar a idiotice de lado definitivamente, o livro apresenta no último capítulo uma espécie de penicilina ideológica: a sugestão de obras fundamentais para a cura da idiotia. Hayek, Arthur Koestler e Karl Popper estão entre os indicados. Embora a leitura da “saga do idiota” seja deliciosa, espero que Mendonza, Montaner e Llosa não precisem escrever mais um livro. Que a sentença por eles decretada no fim do Manual descanse em paz algum dia.

Leitura imperdível.

Aluízio Couto

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ISSN 1749-8457