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Crítica
6 de Maio de 2024   História da filosofia

Demócrito

Daniel W. Graham
Tradução de Desidério Murcho

Demócrito (c. 460–370 a. C.) foi um filósofo pré-socrático grego. Nasceu em Abdera, na Trácia. Partindo de Leucipo e do seu atomismo, desenvolveu a teoria atomista no Pequeno Sistema do Mundo e em vários outros trabalhos. Em resposta ao argumento eleático de que a impossibilidade do não-ser implicava que não há mudança, os atomistas postularam a existência de uma pluralidade de seres indivisíveis — os átomos — e o não-ser — o vácuo, ou espaço vazio. Os átomos não passam a ser, nem perecem, antes se deslocando no vácuo, tornando possível a existência de um mundo e, na verdade, de vários mundos. Pois o vácuo é infinito em extensão, e cheio de um número infinito de átomos que se deslocam e colidem entre si. Nas condições certas, uma concentração de átomos pode começar um vórtice que atrai outros átomos e forma um céu esférico que engloba um mundo. No nosso mundo, há uma Terra plana rodeada de corpos celestes levados por um vórtice. Nascem, florescem e morrem outros mundos como o nosso, mas as suas configurações astronómicas podem ser diferentes das nossas e não precisam de ter criaturas vivas.

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Os átomos são corpos sólidos com inúmeras formas e dimensões, tendo aparentemente peso ou massa, e capazes de se deslocar. Todas as outras propriedades resultam de algum modo destas propriedades básicas. O vórtice cósmico peneira os átomos, tendendo a isolar os que são semelhantes, como o mar separa por tamanhos os seixos no litoral. Por exemplo, os átomos mais pesados afundam-se para o centro do vórtice, e os mais leves, como os do fogo, deslocam-se na direcção ascendente. Os corpos compostos podem crescer devido à agregação de átomos que ficam enredados entre si. As coisas vivas, incluindo os seres humanos, surgiram originalmente do lodo. A vida é um efeito de átomos-alma esféricos e delicados, e as coisas vivas morrem quando perdem estes átomos. A cultura humana evoluiu gradualmente por meio de descobertas ocasionais e imitação da natureza.

Porque os átomos são invisíveis e porque as únicas propriedades reais são as propriedades dos átomos, não podemos ter conhecimento directo seja do que for. O gosto, a temperatura e as cores só conhecemos “por convenção”. Em geral, os sentidos não podem dar-nos senão conhecimento “ilegítimo”; mas há um conhecimento “legítimo” baseado na razão, que começa onde os sentidos acabam — demonstrando, é de presumir, que há átomos que os sentidos não podem testemunhar. Demócrito oferece uma teoria causal da percepção — a que por vezes se chama teoria dos efluxos — que dá conta do gosto em termos de certas formas de átomos, e da visão em termos de “eflúvios” ou filmes de átomos em movimento que atingem o olho.

Apoiando-se tanto na teoria atomista como na sabedoria convencional, Demócrito desenvolveu uma ética da moderação. O fito da vida é a equanimidade (euthumiê), um estado de equilíbrio que se atinge por via da moderação e dos prazeres proporcionais. A inveja e a ambição são incompatíveis com a vida boa.

Apesar de Demócrito ser um dos mais prolíficos autores da Antiguidade, todos os seus trabalhos se perderam. Contudo, conseguimos ver que a sua teoria atomista é a mais plenamente desenvolvida das filosofias pré-socráticas. A sua teoria da matéria influenciou o Timeu de Platão, e a sua antropologia naturalista tornou-se o protótipo das teorias sociais liberais. Demócrito não teve sucessores imediatos, mas um século depois Epicuro transformou a sua ética numa filosofia da consolação fundada no atomismo. O epicurismo tornou-se assim, no início do período moderno, o veículo de transmissão da teoria atomista.

Daniel W. Graham
Cambridge Dictionary of Philosophy, 3.ª edição, ed. Robert Audi (Cambridge: Cambridge University Press, 2015), pp. 253–254.
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ISSN 1749-8457