Por que razão não consigo dividir sete sardinhas inteiras por três gatos? Por que razão não consigo atravessar as sete pontes de Königsberg, uma só vez e numa única caminhada? Por que razão a espécie Magicicada de cigarras da América do Norte tem ciclos de vida ímpares, de 13 ou 17 anos?
O nosso assunto é quádruplo — um livro e seu significado; um homem e suas ideias; uma cultura e suas preocupações; uma sociedade e seus problemas. A sociedade é a Kakania1 — em outras palavras, a Viena dos Habsburgo dos últimos vinte e cinco ou trinta anos do Império Austro-Húngaro, conforme captado com uma ironia perspicaz por Robert Musil no primeiro documental volume do seu romance O Homem Sem Qualidades.
Não poucos filósofos de admirável inteligência consideraram que o fato de normalmente não conseguimos ver de um objeto físico mais do que uma parte da sua superfície tem consequências paradoxais, ou seja, que dele decorre que a crença de “senso comum” segundo a qual podemos ver objetos físicos e, com base nisso, saber que há tais objetos tem de ser ou decididamente rejeitada ou substancialmente modificada.
A filosofia do século XX, tanto na tradição “analítica” como na “continental”, preocupou-se com questões acerca do significado linguístico, e acerca da maneira como a linguagem se relaciona com a realidade. Na tradição analítica, isto foi em larga medida uma consequência das revoluções ocorridas na lógica, e a que Frege e Russell deram o pontapé de saída.
A epistemologia moderna começa com uma teoria da conspiração. “Irei supor”, escreve Descartes, “que um génio maligno, poderoso e astuto, tudo fez para me enganar […] Irei pensar que o céu, o ar, a terra, as cores, formas, sons e todas as coisas externas não passam de sonhos que o génio maligno maquinou como armadilhas para o meu juízo”.
Agatha Christie escreveu em sua autobiografia que sempre fora fascinada pela matemática e que pensou que em algum momento de sua vida, se tivesse continuado seus estudos, teria se tornado uma matemática e nunca teria escrito quaisquer estórias de detetive.
Em um cenário de extrema escassez de recursos hospitalares para elevado volume de pacientes na pandemia por Covid-19, quais devem ser as diretrizes para a alocação de leitos e ventiladores em UTI? Gravidade da situação do paciente? Ordem de chegada? Maiores chances de recuperação da doença? Sorteio? Profissionais da saúde na linha de frente devem ter prioridade? Como lidar com a escolha entre pacientes com a mesma situação clínica, ou seja, com o empate?
Acautele-se o leitor que decida abrir Facfulness, o livro onde Hans Rosling condensou a sua experiência de uma vida como médico, investigador, professor e reputado conferencista de Saúde Internacional, com a colaboração do filho Ola e da nora Anna, que se encarregaram mais especificamente da análise de dados, dos gráficos e das explicações visuais!
A primeira pergunta que deve ocorrer a alguém que pegue no presente livro pela primeira vez é: o que é o Tomismo Analítico? É uma ótima pergunta, mas não é de fácil resposta. A primeira parte da pergunta é, talvez, um pouco mais fácil de responder do que a segunda, pois “Tomismo” pode ser mais facilmente identificado como se referindo a um corpus particular de pensamento, a saber, o pensamento de Tomás de Aquino e a subsequente interpretação das suas ideias.
A questão filosófica central quanto aos objetos abstratos é esta: Há alguns? Uma resposta afirmativa — dada pelos platónicos ou realistas — apoia-se no facto de parecer que partes significativas do nosso discurso e pensamento dizem respeito a objetos que estão para lá do espaço e do tempo, sendo por isso incapazes de entrar em relações causais, apesar de grande parte desse discurso dizer respeito a objetos concretos (grosso modo, objetos com extensão espácio-temporal).
Neste livro oportuno, Toby Ord defende que há uma probabilidade em seis de a humanidade sofrer uma catástrofe existencial nos próximos cem anos, e que minimizar esse risco deve ser uma das maiores prioridades a nível global. Vivemos numa época de elevado risco existencial, devido a tecnologias tão poderosas como as armas nucleares, a biotecnologia e a inteligência artificial.
Neste livro, Joseph Raz, um dos grandes expoentes da Filosofia do Direito contemporânea, se propõe à tarefa de refletir criticamente sobre os valores morais universais. Como um dos convidados da Conferência Seeley de 2000, buscou clarificar a tese de que os valores morais são universais.
Muitas pessoas são atraídas por conceções construtivistas da verdade, da justificação e da racionalidade, aceitando que há muitas maneiras radicalmente diferentes, mas igualmente válidas de conhecer o mundo. Ou seja, defendem a tese de que todo o conhecimento é socialmente construído.
Ao lado do grande “D” vermelho, na parte inferior do trabalho final que escrevi para um curso de ciência política de nível médio, durante o segundo semestre da faculdade, estava escrito: “Você pensa como um filósofo, não como um cientista político”.
Suponha que você esteja lendo A Terra Inútil de Eliot, Rei Lear de Shakespeare, Ulisses de Joyce e A enfermaria nº 6 de Chekhov. Você está lendo um poema, uma peça, um romance e um conto. Poderíamos também dizer que você está lendo uma obra de literatura, ou de literatura imaginativa — embora no caso de Rei Lear alguém pudesse se inclinar a negar isso, pretendendo distinguir nitidamente literatura de drama.
Há muita coisa que não sabemos sobre a COVID-19. Quanto mais tempo demorarmos a descobri-lo, mais vidas se irão perder. Neste artigo, iremos defender um princípio de paridade de risco: se é permissível expor alguns membros da sociedade a um certo nível de risco ex ante, a fim de minimizar os danos gerais do vírus, então é permissível expor voluntários totalmente informados a um nível de risco comparável no contexto de investigações promissoras sobre o vírus.
Deixe-me contar — brevemente — sobre um estranho caso da história da filosofia. Alexius Meinong (1853–1920) foi um psicólogo austríaco e filósofo sistemático. Parte de seu trabalho era apresentar uma análise sofisticada do conteúdo do pensamento. Um aspecto notável sobre isso é o que se segue. Se você está pensando sobre o Taj Mahal, você está pensando sobre algo.
Não nos iludamos. É difícil construir um avião mais rápido do que uma bala. É difícil correr a maratona. Compor As Bodas de Fígaro não deve ter sido fácil. Escrever Os Miseráveis também não. A física é difícil, a matemática é difícil. A lógica é difícil. Muitas coisas valiosas são difíceis — e pretender que não são é iludirmo-nos.
A história está cheia de exemplos de condutas desumanas de uma pessoa frente a outra. Alguns atos são obras de indivíduos isolados, como o assassino em série Andrei Chikatilo ou do vigarista Bernie Madoff. Muitos males especialmente sinistros foram perpetrados por nações ou grupos: o Holocausto, as remoções estalinistas, e a matança dos Tutsis em Ruanda.
O governo representativo é um fenómeno relativamente recente: não tem mais de um século e meio. Isto significa que, durante muito tempo, a teoria democrática foi essencialmente especulativa, alimentada por muito romantismo e boas intenções. Hoje, porém, dispomos de resultados que vêm da experiência; e isso justifica, no mínimo, que a teoria democrática deve ser confrontada com os factos.
O meu amigo João veio cá casa tomar um café. Enquanto aqueço a água, digo-lhe: “existe uma chávena no armário”. O João abre o armário. Et voilà! O João encontra uma chávena no armário. De acordo com a teoria da verdade como correspondência, a frase “existe uma chávena no armário” é verdadeira se, e só se, é um facto que existe uma chávena no armário.
Quanto custa salvar uma vida? Será demasiado difícil? Será demasiado caro? Será sequer que tenho a obrigação de tentar fazê-lo? Talvez este tipo de questões seja demasiado complexo para esperar obter respostas práticas que não sejam independentes dos benefícios realmente a atingir.
Filósofo alemão (1889–1976), professor nas universidades de Marburgo (1923–1928) e Freiburg (1928–1951), Heidegger é famoso pelas suas teorias do ser e da natureza humana e pelas suas interpretações singulares da metafísica tradicional.
Quem estuda lógica sabe que existem pelo menos duas maneiras de rejeitar um argumento: 1) encontrar algum defeito na passagem das premissas para a conclusão; 2) rejeitar as premissas. Aceitando as premissas e raciocinando bem, devemos também aceitar as conclusões que se seguem delas.
A tensão entre ciência e religião é antiga e bem documentada. Talvez o exemplo mais conhecido seja o embate entre Galileu e a Igreja Católica. Em 1633, a Inquisição forçou Galileu a abandonar publicamente suas teses copernicanas, e o condenou a passar os últimos anos de sua vida em prisão domiciliar, em Florença.
A publicação do Manifesto do Partido Comunista (1848), escrito por Marx e Engels, pode considerar-se o ato que, simbolicamente, inaugura um dos mais importantes movimentos sociais, políticos, ideológicos… e filosóficos dos últimos séculos: o movimento comunista.
A lógica enquanto ciência que estuda as condições de validade dos argumentos foi fundada por Aristóteles (384-322 a. C.). Paralelamente ao estudo da noção de validade e de outras noções centrais da lógica, Aristóteles desenvolveu a teoria do silogismo.
O que nos torna bons ou maus? Essa profunda questão filosófica foi alvo de um experimento psicológico desenvolvido em 1997 pelo psicólogo Richard Baron. O estudo foi publicado num periódico americano tradicional da área de psicologia social e descreve os métodos e resultados da pesquisa de Baron.
A Europa, a Índia e a China têm tradições, religiões, folclore, poesia, arte e apanhados de máximas que dão corpo à sabedoria que emana da experiência. Desenvolveram também corpos de pensamento que são distintamente filosóficos, na forma de debates detalhados e, em quase todos os casos, escritos, sobre teorias e ideias metafísicas, epistemológicas, éticas e políticas.
“The MIT Press Essential Knowledge series” tem como objetivo publicar livros sobre temas atuais de modo acessível, conciso e bem fundamentado. Para tanto, convida especialistas renomados para oferecer uma visão geral de um assunto particular que tem chamado a atenção da sociedade.
Durante séculos, o entendimento cristão dominante da mensagem do evangelho era a teologia da substituição. Deste ponto de vista, o Novo Testamento é a história em que o ressequido legalismo judaico é conquistado pela fé cristã viva, alegre e plena de graça. A teologia da substituição persiste em alguns círculos, mas é falsa.
Segundo o Tractatus, todas as frases com sentido pertencem a uma de três classes: tautologias, que são verdadeiras em virtude do significado; contradições, que são falsas em virtude do significado; e frases sintéticas, cuja verdade ou falsidade depende do que significam e de como é o mundo.
A história da filosofia, tal como hoje é vista por estudantes e professores de filosofia, é uma construção retrospectiva. É escolhida a partir do fluxo mais vasto da história das ideias de modo a fornecer os seus antecedentes às preocupações filosóficas de hoje.
Pensamos que o ensino superior tem vários defeitos morais sérios. Do ponto de vista da ética dos negócios, a universidade média faz a Enron parecer uma santa. Os problemas das universidades são profundos e fundamentais: a maior parte das técnicas de vendas das universidades é semifraudulento.
O Iluminismo Agora, de Steven Pinker, apresenta uma defesa poderosa da ideia de que em todas as métricas as condições de vida dos seres humanos melhoraram persistentemente nos últimos duzentos anos. Esta melhoria pode ser atribuída não apenas à difusão dos princípios do iluminismo.
Nelson Goodman (1906–1998) foi um dos mais importantes filósofos do século XX. As suas obras reconfiguraram a epistemologia, a metafísica e a filosofia da arte. The Structure of Appearance (1977), que parte da sua dissertação de doutoramento, mostra como construir sistemas formais interpretados que resolvem ou dissolvem problemas epistemológicos e metafísicos persistentes.
Este é o título do original The Grasshoper: Games, Life, and Utopia — um livro curioso e interessantíssimo, por várias razões. Telegraficamente, pelos problemas que aborda e pelo modo como o faz. É (mais uma) prova de que, como na introdução salienta Thomas Hurka, se pode fazer filosofia séria sem o ar grandiloquente e por vezes pouco claro de renomeados filósofos.
A certeza é a propriedade de ser certo, que é uma propriedade psicológica de pessoas ou uma característica epistémica de objectos que são como que proposições (e.g., crenças, enunciados, afirmações). Podemos dizer que uma pessoa, S, está psicologicamente certa de que p (em que “p” está no lugar de uma proposição) desde que S não tenha quaisquer dúvidas de que p é verdadeira.
As investigações e os debates acerca da compreensão que temos de nós mesmos enquadra-se no âmbito da antropologia. Desenvolvidas tanto em termos filosóficos, com análises e definições conceituais e a priori, quanto em termos científicos, a partir de práticas empíricas e observacionais, as investigações antropológicas buscam compreender o que somos e, consequentemente, o que é possível para seres vivos como nós.
Os seus defensores filosóficos têm tentado habitualmente mostrar que a fé não está em conflito com a razão: que é internamente consistente, que está em harmonia com o conhecimento científico, ou até, mais positivamente, que algumas das suas posições podem ser estabelecidas de maneira independente por meio de raciocínio filosófico.
A fé tornou-se um tópico de discussão na tradição filosófica ocidental devido à sua proeminência no Novo Testamento, no qual os autores exortam a que se tenha fé ou se passe a tê-la. O Novo Testamento faz por sua vez eco tanto de conceitos helenísticos de fé como de tradições bíblicas mais antigas, especificamente a de Abraão, no Livro do Génesis.
Se a ideia de que a filosofia é uma ciência choca o leitor, isso pode ser apenas o resultado de uma concepção excessivamente restritiva de filosofia ou de ciência: “A filosofia é uma ciência de direito próprio, interligada com outras e tão autónoma como elas.” (p. 150)
Pelo menos desde a década de oitenta, em colégios e universidades por todo o planeta têm sido dados cursos de pensamento crítico. Estes cursos são na sua maioria leccionados pelos departamentos de filosofia, e visam dar aos estudantes as competências gerais que são necessárias em todas as disciplinas académicas.
Uma frase é uma sequência de palavras, formada segundo as regras sintácticas de uma língua. Mas uma frase tanto tem propriedades semânticas como sintácticas: tanto as palavras como a frase completa têm significado. Os filósofos têm tido tendência para se centrar nas propriedades semânticas das frases indicativas, em particular no facto de serem verdadeiras ou falsas.
Alguns professores de Filosofia têm reagido negativamente às alterações recentemente introduzidas pelas Aprendizagens Essenciais (AE) ao ensino da lógica no secundário. Mais precisamente, os seus protestos são contra o seguinte: 1) O fim da “opção segundo os paradigmas das lógicas aristotélica ou proposicional”; 2) A passagem da lógica do 11.º ano para o início do 10.º ano.
Todas as pessoas usam inevitavelmente, e sempre usaram, raciocínios dedutivos das mesmas formas lógicas — uns válidos, outros inválidos. Isso é particularmente visível nos diálogos de Platão, mas também no pensamento clássico indiano e chinês. Porém, tal como há um abismo de diferença entre usar uma língua e sistematizar a sua gramática, também há uma diferença hiante entre usar raciocínios dedutivos e sistematizá-los.