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Crítica
25 de Agosto de 2024   Epistemologia

Alvin Goldman

John R. Shook
Tradução de Desidério Murcho

Alvin Ira Goldman nasceu na cidade de Nova Iorque, no dia 1 de Outubro de 1938, e morreu no dia 4 de Agosto de 2024. Concluiu a licenciatura na Universidade da Colúmbia em 1960. Concluiu depois as suas qualificações de pós-graduação na Universidade de Princeton: o mestrado em 1962, e o doutoramento em filosofia em 1965. A sua carreira como professor começou na Universidade de Michigan como assistente de filosofia em 1963. Depois de ascender a professor efectivo deixou Michigan em 1980 para assumir o cargo de professor de filosofia na Universidade de Illinois, em Chicago, onde deu aulas até 1983. Deste ano a 2002, Goldman foi Professor Distinto de Filosofia na Universidade do Arizona. Foi presidente do Sector do Pacífico da Associação Filosófica Americana em 1991/92. Em 2002, tornou-se Professor Destacado de Filosofia da Universidade de Rutgers.

Goldman publicou livros e artigos sobretudo sobre epistemologia, filosofia da mente e ciências cognitivas. Como muitos filósofos analíticos da sua geração, os seus primeiros esforços em epistemologia foram na direcção de formular uma solução para os problemas graves que Edmund Gettier levantou em 1963 à teoria da “crença justificada verdadeira” do conhecimento. Em “A Causal Theory of Knowning” (1967), Goldman propôs uma perspectiva da justificação segundo a qual existe um tipo qualquer de relação causal entre a crença de uma pessoa e o facto conhecido por essa pessoa, de tal modo que esta relação tenda a produzir mais crenças verdadeiras. Dado que a existência dessa relação causal não tem de ser também conhecida pela pessoa que sabe, Goldman rejeita essa exigência internista e sustenta ao invés a naturalização da epistemologia e o externismo epistémico. Este tipo de externismo veio a ser denominado “confiabilismo” e a maior parte dos confiabilistas foram inspirados por Goldman, incluindo alguns dos mais importantes, como D. M. Armstrong, Robert Nozick e Fred Dretske.

No seu confiabilismo, elaborado em “What is Justified Belief?” (1979), Epistemology and Cognition (1986) e em livros posteriores, Goldman formula um género de fundacionalismo ao distinguir entre processos de ordem superior que dependem de crenças (como o raciocínio) e processos de ordem inferior independentes das crenças, como a percepção. A percepção provoca causalmente a formação de crenças, mas só pode resultar em conhecimento se resultar dos processos mais confiáveis disponíveis ao sujeito. Goldman tenta evitar o género de cepticismo que ataca o confiabilismo (como os cenários do cérebro numa cuba), exigindo que os processos confiáveis necessários para o conhecimento o sejam no género de “mundos normais” que são consistentes com as nossas crenças gerais acerca do mundo actual.

No livro A Theory of Human Action (1970), os processos causais aplicam-se também à compreensão do agir. Contra Elizabeth Anscombe e Donald Davidson, Goldman defende que só algumas descrições do comportamento de um agente podem ser identificadas como a mesma acção intencional. Na sua teoria, o comportamento de um agente só é um acto intencional “básico” se tiver sido causado da maneira apropriada pelo conhecimento do agente dos seus quereres e crenças, e pela sua actuação nessa base.

Pondo a sua confiança nas ciências neurológicas e cognitivas ao serviço da descoberta dos processos fisiológicos e psicológicos responsáveis pela cognição confiável, Goldman advogou uma aliança íntima entre a epistemologia e as ciências cognitivas. Como Fred Dretske e outros filósofos, Goldman descreveu a informação como algo que resulta do funcionamento de um complexo mecânico suficientemente sensível para distinguir e registar mudanças no seu meio ambiente. O novo epistemólogo (que faz agora “epistémica”, segundo Goldman) irá partir do conhecimento fornecido pelas ciências cognitivas para investigar até que ponto um processo tem de ser confiável para ser considerado conhecimento. Especialmente proveitoso seria a compreensão por parte das ciências cognitivas dos processos de percepção mais básicos ou nativos que produzem conhecimento fundacional.

Segundo os próprios exemplos de Goldman, presentes em Epistemology and Cognition e Philosophical Applications of Cognitive Science (1993), o novo epistemólogo irá continuar a tentar erigir uma teoria do conhecimento e da justificação que seja imune a quaisquer contra-exemplos ao estilo dos de Gettier. Há várias tensões nesta combinação da epistemologia tradicional com as ciências cognitivas, mas basta dar três exemplos:

  1. O confiabilismo aceita a produção de crenças que é mais provável que sejam verdadeiras ou próximo disso, ao passo que o conhecimento tem habitualmente exigido a crença inteiramente verdadeira;
  2. O confiabilismo tem dificuldade em decidir por si que tipos de processos de conhecimento e de aprendizagem são mais relevantes e valiosos para os seres humanos neste mundo actual, ao passo que a epistemologia tradicional aproveita ao máximo as nossas instituições sociais de produção de conhecimento (a que Goldman chama “costumes epistémicos”); e
  3. O confiabilismo funda-se nas conclusões descritivas das ciências cognitivas, ao passo que a epistemologia tem tipicamente tido uma dimensão normativa.

Goldman enfrentou criativamente estas tensões, produzindo uma teoria do conhecimento muitíssimo original.

Em Liaisons: Philosophy Meets the Cognitive and Social Sciences (1992) e Knowledge in a Social World (1999), a sua combinação de epistemologia e ciências cognitivas exige uma divisão do trabalho entre a epistemologia individual e a social. A epistemologia individual considera a pessoa isolada que conhece, ao passo que a social, segundo Goldman, considera como as pessoas que conhecem processam e usam conhecimento em grupos. O conhecimento em si, para Goldman, continua a ser uma questão individual, como a crença; quando uma pessoa sabe qualquer coisa, esse conhecimento não depende de outras pessoas que saibam o mesmo. Outras epistemologias sociais fundam-se em alguns tipos de crenças e conhecimento que nunca são posse individual; Goldman reconhece esta possibilidade, mas não lida com as crenças de grupos.

A epistemologia social de Goldman considera como as crenças verdadeiras podem ser maximizadas nos grupos ou equilibradas com outros valores sociais. A epistemologia social deve incidir sobre o “veritismo”, pois o objectivo da verdade é essencial nas actividades intelectuais. Há cinco padrões de prática social veritista (1992, p. 195):

  1. A confiabilidade de uma prática, medida pela proporção de verdades em contraste com os erros em todas as crenças produzidas pela prática;
  2. O poder de uma prática: a sua capacidade para guiar os sujeitos para as verdades que lhes interessam;
  3. A fecundidade de uma prática: a sua capacidade para levar um grande número de crenças verdadeiras a muitas pessoas;
  4. A velocidade da prática: a rapidez com que produz crenças verdadeiras; e
  5. A eficiência da prática: o grau de economia no fornecimento de crenças verdadeiras.

Knowledge in a Social World aplica estes padrões a quatro práticas cognitivas: ciência, direito, democracia e educação.

Pathways to Knowledge: Private and Public (2002), constituído por ensaios publicados de 1997 a 2001, continua a explorar a epistemologia social com base nas ciências cognitivas. Goldman sugere que o internismo epistémico é incompatível com a naturalização científica da epistemologia, ao mesmo tempo que sugere que uma compreensão adequadamente reformada do a priori, das intuições e da introspecção continuará a ser útil para as ciências cognitivas e a epistemologia. A teoria dos memes de Richard Dawkins foi incorporada na epistemologia social de Goldman, juntamente com uma preocupação com as pressões sociais e as limitações tecnológicas que direccionam e restringem a investigação científica. Neste ponto, a obra de Goldman cruza-se com a de Philip Kitcher, que insiste numa perspectiva mais pragmatista do conhecimento, e com a de Nicholas Rescher, que aplicou o pragmatismo à economia da ciência.

John R. Shook
The Dictionary of Modern American Philosophers, ed. John R. Shook (Bristol: Thoemmes Continuum, 2005), pp. 951–953.

Bibliografia

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Leitura complementar

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