Para entender a história de uma ideia temos de evitar introduzir no passado o nosso entendimento presente. É um erro supor que uma ideia que agora consideramos inaceitável nunca tenha sido parte de uma ciência genuína.
Para um cientista, distinguir entre ciência e pseudociência é similar a andar de bicicleta. A maioria das pessoas sabe andar de bicicleta, mas apenas algumas conseguem explicar como o fazem. De alguma maneira temos a capacidade de manter o equilíbrio, e todos parecemos fazê-lo de maneira aproximadamente igual, mas como fazemos isso?
A tensão entre ciência e religião é antiga e está bem documentada. Talvez o exemplo mais conhecido seja o embate entre Galileu e a Igreja Católica. Em 1633, a Inquisição forçou Galileu a abandonar publicamente suas teses copernicanas, e o condenou a passar os últimos anos de sua vida em prisão domiciliar, em Florença.
No ano de 2015 foram divulgadas na imprensa algumas notícias acerca de uma das mais esperadas descobertas científicas dos últimos tempos.
A demarcação entre ciência e pseudociência faz parte da tarefa mais abrangente de determinar quais são as crenças epistemicamente justificadas. Este verbete esclarece a natureza específica da pseudociência em relação a outras categorias de doutrinas e de práticas não-científicas, inclusive a recusa da ciência e a resistência aos fatos.
A pseudociência é um fenômeno complexo como a ciência e, como a treta, pode ser sofisticada e artisticamente elaborada. É social, política e epistemicamente importante fazer a taxonomia desses fenômenos, e o presente capítulo oferece uma modesta contribuição para tal projeto. Argumentarei, primeiro, que o conceito de pseudociência é diferente dos conceitos de não-ciência, de má ciência e de fraude científica.
Tanto na ciência como na vida quotidiana, o objectivo da investigação é frequentemente encontrar uma explicação para um fenómeno intrigante. Mas o que é exactamente uma explicação? E como contribui o nosso conhecimento de verdades gerais para a nossa capacidade de explicar?
A astrologia já foi considerada uma ciência, assim como a teologia, é claro. Nas universidades medievais o currículo principal era constituído pelas sete “artes” e “ciências” liberais: gramática, retórica e lógica; matemática, geometria, música e astronomia (incluindo astrologia).
Ninguém duvida seriamente de que muitas das ciências particulares existentes se desenvolveram a partir das necessidades práticas da vida quotidiana: a geometria a partir de problemas de medição dos campos, a mecânica a partir de problemas suscitados pelas artes arquitectónicas e militares, a biologia a partir de problemas da saúde humana e da criação de animais.
Uma linha de resposta bastante diferente para o problema da indução deve-se a Karl Popper. Popper olha para a prática da ciência para nos mostrar como lidar com o problema. Segundo o ponto de vista de Popper, para começar a ciência não se baseia na indução. Popper nega que os cientistas começam com observações e inferem depois uma teoria geral.
Para ilustrar com simplicidade alguns aspectos importantes da investigação científica, consideremos os estudos de Semmelweis sobre a febre de parto. Ignaz Semmelweis, um médico de origem húngara, realizou esses estudos de 1844 a 1848 no Hospital Geral de Viena.
Sugiro que o objectivo da ciência é encontrar explicações satisfatórias para aquilo que consideramos precisar de uma explicação. Por explicação (ou explicação causal) entendo um conjunto de enunciados em que uns descrevem o estado de coisas a ser explicado (o explicandum) enquanto que os outros, os enunciados explicativos, formam a “explicação” no sentido estrito da palavra (o explicans do explicandum).
Houve um tempo em que as teorias eram eternas. Ou, pelo menos, assim pareciam. A física de Aristóteles e a cosmologia de Ptolomeu, por exemplo, ambas formuladas na Antiguidade, foram aceites sem muitas modificações até ao século XVII. Mas, nesse século, devido à revolução científica levada a cabo por Bacon, Galileu e Descartes e, em particular, por Newton, tudo mudou.
Está na moda ter uma raiva apocalíptica da ameaça que representa à humanidade o vírus da AIDS, o mal da “vaca louca” e muitos outros, mas penso que devemos nos preocupar com a fé, um dos grandes males do mundo, comparável ao vírus da varíola, mas mais difícil de erradicar.
A ideia de que a mente humana no seu esforço para compreender a realidade é capaz de operar a níveis diferentes é tão velha quanto a própria filosofia. Há vinte e quatro séculos Platão traçou uma distinção entre aquilo a que chamou opinião e conhecimento.
Deveriam os cientistas acreditar em tudo aquilo que dizem? Deveriam eles acreditar nas afirmações de suas teorias científicas bem desenvolvidas e na existência das coisas microscópicas exóticas que dizem agora popular os alcances inobserváveis da realidade? Ou uma atitude mais modesta perante a investigação científica seria preferível?
Até agora tenho oferecido argumentos contra o empirismo redutivo, contra várias versões de instrumentalismo, tanto do tipo eliminativo quanto do tipo duheniano (não-eliminativo). Vimos que a chamada “via de Ramsey” não oferece um compromisso estável e satisfatório entre o realismo e o instrumentalismo.
Originalmente publicado em 1977, temos agora à disposição em português O Progresso e seus Problemas, de Larry Laudan. Escrito no contexto das discussões acerca da racionalidade e objetividade da ciência geradas pela publicação de A Estrutura das Revoluções Científicas (1962), de Thomas Kuhn, o livro de Laudan contribuiu para avançar o debate em filosofia da ciência.
Lembro-me de me dizerem, quando era criança, que em tempos era ainda possível a uma pessoa de muita instrução saber tudo o que se sabia. Disseram-me igualmente que hoje em dia sabe-se tanto que não era concebível que alguém soubesse mais do que uma diminuta fracção disso, ainda que numa vida longa. A última proposição surpreendeu-me e fez-me ficar desapontado.
No século XXI ninguém é empirista lógico. É certo que há não poucos filósofos cujo trabalho se assemelha em aspectos relevantes ao trabalho dos empiristas lógicos e que, de fato, se tivesse sido feito na década de 1950, seria um trabalho empirista lógico. Mas ninguém apresenta tal trabalho sob a rubrica “empirismo lógico”.
“Memorandum. Há muito que recomendar e aplaudir na filosofia experimental”, afirmou Berkeley nos seus cadernos de anotações pessoais (C 498). Esta recomendação não era só de fachada. O interesse de Berkeley pela ciência experimental, ou filosofia experimental como a denominava, segundo o uso normal nos séculos XVII e XVII, foi intenso e genuíno.
Num certo sentido, sabemos suficientemente bem o que comumente se quer dizer com “lei da natureza”. Podemos dar exemplos. São ou acredita-se que sejam leis da natureza: que a órbita de um planeta em torno do Sol seja elíptica; que o arsênico seja venenoso; que a intensidade de uma sensação seja proporcional ao logaritmo do estímulo.
Precisamos de mais um texto introdutório em filosofia da ciência? Esta questão vem à tona a cada novo lançamento na área, demandando de nós uma avaliação criteriosa dos inúmeros Introductory Readings que chegam ao mercado editorial ano após ano.
A filosofia da ciência pode ser proveitosamente divida em duas amplas áreas. A epistemologia da ciência lida com a justificação da alegação de que temos conhecimento científico. A metafísica da ciência investiga aspectos filosoficamente intrigantes do mundo descrito pela ciência.
Os cientistas nos surpreendem freqüentemente: energia escura, bactérias que deram origem a complexos celulares, universo eterno, quarks e leptons, ar deflogisticado, éter, grávitons, e assim por diante. Muitas dessas coisas existem; algumas nunca existiram, e outras talvez nunca saibamos.
Há um debate antigo na filosofia entre duas escolas de pensamento opostas chamadas realismo e idealismo. O realismo sustenta que o mundo físico existe independentemente do pensamento e da percepção humana. O idealismo nega-o — afirma que o mundo físico é de algum modo dependente da atividade consciente dos seres humanos. A muitas pessoas, o realismo parece mais plausível do que o idealismo.
Terminou recentemente o centenário do nascimento de Karl Popper, em 2002, e com isso as celebrações, os congressos e as comemorações, das quais participou também a comunicação social. Popper é de fato um dos poucos pensadores interessados nos problemas científicos cujo nome se tornou conhecido do público mais amplo.
Steven Weinberg é um físico peculiar. Apesar de ser o autor do artigo mais citado de sempre da história da física, raramente reserva para as equações que lhe granjearam o prémio Nobel (1979) um papel mais do que secundário nos seus livros.
Estou certo que ao longo dos cento e tal mil anos de existência da nossa espécie, e até antes, os nossos antecessores olhavam para o céu nocturno e perguntavam-se o que são as estrelas. Perguntavam-se portanto como explicar o que viam em termos de coisas que não viam.
Paulo — Gostei muito da aula de hoje. Achei a teoria de Popper fascinante! A ideia de dar importância ao que se pode provar que é falso em vez de dar importância ao que se pode provar que é verdadeiro é realmente brilhante.
Imagine que atiro uma pedra num lago, provocando uma série de pequenas ondas concêntricas. Os filósofos dirão que esta ação envolve um processo causal: o ato de jogar a pedra é a causa e as ondas concêntricas o efeito. Também dirão que, a princípio, parece que nunca observamos o inverso desse processo, em que surgiriam primeiro as ondas e só depois a pedra cairia no lago.
A filosofia da ciência é uma das mais velhas subdivisões da filosofia, remontando pelo menos a Aristóteles. Está hoje em rápido crescimento, uma vez que os grandes avanços científicos do último século têm levado os filósofos a pensar mais cuidadosamente sobre a ciência. Estes filósofos poderão vir a influenciar o futuro da ciência.
A Estrutura das Revoluções Científicas, de Thomas Samuel Kuhn (1922–1996), é uma das obras mais influentes em filosofia da ciência; menos pela solidez de seus argumentos do que pelo elevado número de divergências e debates que tem causado.
Se quiser ler apenas um livro este ano, leia este. Além de muitíssimo bem escrito, combinando com mestria a sobriedade e o distanciamento com o humor e a leveza, é de tal forma abrangente e o tema é tão central que é praticamente impossível ser uma pessoa culta e ignorar este livro.
Hoje em dia, o compromisso explícito com a filosofia da ciência quase não tem lugar na preparação dos físicos ou na investigação física. O pouco que os estudantes aprendem sobre temas filosóficos é normalmente aprendido ao acaso, por uma espécie de osmose intelectual. Apanham-se ideias ou opiniões na sala de aulas, no laboratório, e em colaboração com o supervisor.
Quando pegamos pela primeira vez neste substancial volume de 600 páginas, que nos promete contar a história da ciência ocidental dos últimos 500 anos, somos assaltados pela inevitável vontade de o ler de um só fôlego. Logo na capa, na edição da Penguin, deparamos com uma belíssima reprodução renascentista de “Os Geógrafos”, uma imagem fortemente ilustrativa.
De acordo com a célebre afirmação de Whitehead, a história da filosofia resume-se a uma série de notas de rodapé a Platão. Com um exagero mais tolerável, pode-se afirmar que os livros de Karl Popper consistem numa série de notas de rodapé à sua obra filosoficamente mais robusta e conseguida — A Lógica da Descoberta Científica.
De James Gleick estão publicadas entre nós as obras “Cada Vez Mais Rápido” (Temas e Debates, 2003), “Feynman: A Natureza do Génio” (Gradiva, 1993) e “Caos” (Gradiva, 1989). Este novo livro não desilude. Rigoroso mas acessível, sintético mas abrangente, Gleick oferece-nos uma biografia surpreendente de Newton.
A filosofia da ciência pode ser dividida em duas grandes áreas: a epistemologia da ciência e a metafísica da ciência. A epistemologia da ciência discute a justificação e a objectividade do conhecimento científico. A metafísica da ciência discute aspectos filosoficamente problemáticos da realidade desvendada pela ciência.
Este ensaio pretende oferecer ao aluno uma panorâmica geral e introdutória do modo como os filósofos têm encarado as ciências da natureza ao longo da história, e apresentar simultaneamente alguns elementos básicos da própria história do desenvolvimento científico.
Gostaríamos de agradecer a Tony Atkinson, Harvey Brown, Paul Castell, Helena Cronin, Martin Davies, Dorothy Edgington, Elizabeth Frazer, Miranda Fricker, James Logue, Ana Nettel, John Preston, John Roche, Simon Saunders, Tom Stoneham, Maricio Suarez, e Adam Swift pela sua ajuda na compilação desta bibliografia.
O problema da demarcação consiste em distinguir a ciência das disciplinas não científicas que também pretendem fazer afirmações verdadeiras sobre o mundo. Os filósofos da ciência foram propondo vários critérios.
Na Introdução arrisquei sugerir que o lema “A ciência deriva dos factos” capta uma concepção popular da característica distintiva da ciência. Nos primeiros quatro capítulos deste livro, esta perspectiva será sujeita a um escrutínio crítico. Descobriremos que muitas das implicações tipicamente atribuídas ao lema são indefensáveis.
O título deste livro é enganador, pois o objectivo de Michael Ruse não é investigar se a evolução darwinista tem alguma finalidade última que guie os vários processos de variação e selecção, mas sim a de averiguar qual o lugar do pensamento teleológico, qual o lugar de conceitos como desígnio, causas finais, função e propósito, no estudo da biologia.
Este livro é um “case study”. Usando a história da teoria da evolução pela selecção natural, o autor procura determinar até que ponto é a evolução biológica uma mera construção humana, como defendem alguns sociólogos e filósofos, ou se é uma realidade, como defendem outros filósofos e praticamente todos os cientistas.
Os biólogos contemporâneos que escrevem para o público em geral têm, na maior parte das vezes, mais a comunicar do que informações de carácter científico. Têm lições a dar sobre como devemos pensar sobre nós mesmos e sobre a nossa relação com o Universo.
“Sociólogos influentes anunciam, com grande confiança, que os resultados das ciências, obtidos com muito trabalho e através de muita observação, experimentação e reflexão, durante os últimos quatrocentos anos, nada têm a ver com a Natureza e o mundo externo em investigação, mas são apenas narrativas, como os mitos e os contos de fadas, ou o resultado de acordos sociais”.
Acompanhar a filosofia da ciência numa perspectiva primariamente histórica, e não temática, tem os seus atractivos. John Losee adoptou essa perspectiva na sua “Introdução Histórica à Filosofia da Ciência” e soube explorar esses atractivos. Com este livro podemos ver não só como os filósofos foram respondendo às propostas dos seus contemporâneos e antecessores, mas também como a filosofia da ciência evoluiu.
Entre as muitas contribuições importantes de Duhem para a filosofia da ciência, talvez a mais importante seja a sua formulação daquilo a que chamarei tese de Duhem. Com a sua clareza e agudeza habituais, Duhem formula a sua tese numa secção com o seguinte título: “Uma Experiência na Física Nunca Pode Condenar uma Hipótese Isolada, mas Apenas um Grupo Teórico no seu Todo”.
Tomo a liberdade de me dirigir a si rogando-lhe que seja o juiz numa disputa entre mim e uma pessoa minha conhecida que já não posso considerar um amigo. A questão em discussão é a seguinte: É a minha criação, a guardachuvalogia, uma ciência? Permita-me que explique a situação.
A ciência tem de envolver mais do que a mera catalogação de factos e do que a descoberta, através da tentativa e erro, de maneiras de proceder que funcionam. O que é crucial na verdadeira ciência é o facto de envolver a descoberta de princípios que subjazem e conectam os fenómenos naturais.