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Crítica
20 de Agosto de 2004   Filosofia

A ética da prática filosófica

R. W. Hepburn
Tradução de Desidério Murcho

A prática filosófica faz exigência morais extenuantes: honestidade e equidade para com os oponentes na argumentação; uma capacidade para tolerar uma incerteza prolongada quanto a questões sérias; a força de carácter para mudar as nossas ideias quanto a crenças básicas, e para seguir a argumentação e não as nossas inclinações emocionais; independência mental em vez da disposição para seguir as modas filosóficas.

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Dúvidas?

O respeito moral pelos leitores e ouvintes exige que um filósofo evite a persuasão não racional, que não seja adulador, que não escarneça das outras pessoas e que não as procure manipular de outras formas de modo a concordarem com ele. A filosofia devia demonstrar que podemos discordar profundamente sobre questões fundamentais sem abandonarmos uma razoabilidade comum. O mesmo respeito exige que o filósofo exponha a estrutura do seu argumento tão claramente quanto possível, de modo a encorajar, e não impedir, a sua crítica.

A claridade e a simplicidade de estilo, o uso mínimo de expressões técnicas e o abandono do aparato técnico quando a linguagem comum pode ser adequada expressam também uma preocupação em ser entendido e em deixar ao argumento e à justificação, só por si, o papel de persuadir. Um estilo enfatuado e obscuro pode mascarar lacunas reais na argumentação. Um estilo pretensioso pode dissimuladamente trabalhar no sentido de desarmar a apreciação crítica, substituindo a autoridade do argumento bom com a pretensa autoridade pessoal do filósofo, apresentado como um sábio.

A filosofia tem uma responsabilidade séria pela linguagem. É um dos seus mais importantes guardiães — obrigada a opor-se a terminologias que enleiam ou confundem o pensamento. Uma linguagem negligente e imprecisa perde sensibilidade às distinções entre o razoável e o irrazoável, entre o argumento bom e o mau — em qualquer área, incluindo as áreas da moral pessoal e política. Empobrecer os recursos da linguagem pode também empobrecer a experiência humana, negando-nos as palavras de que precisamos para articular a sua variedade.

Será que sublinhar o estilo e o domínio da linguagem implica que a filosofia é um ramo da literatura? Em alguns aspectos importantes, a filosofia é literatura. Mas a aproximação é levada demasiado longe quando um filósofo deixa que a apresentação imaginativamente vívida de uma perspectiva sobre o mundo lhe dê uma aparência de auto-evidência, desviando a atenção crítica do facto de as categorias não terem sido deduzidas e de a justificação argumentativa ter sido subordinada à expressão da “visão” semi-poética.

Os filósofos precisam, pois, de um robusto sentido da sua falibilidade. É insensato que um filósofo aspire ao papel de especialista ou autoridade, pois isso é um passo mais no sentido do enfraquecimento da atenção crítica por parte de leitores e ouvintes de que o filósofo constantemente carece.

R. W. Hepburn
Oxford Companion to Philosophy (Oxford University Press, 1995, pp. 665-666)

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ISSN 1749-8457