Desde Heródoto que se tornou comum pensar que as diferenças morais entre povos e culturas são evidência segura do relativismo moral: o que numa cultura é moralmente aceitável é reprovável noutra. Mas serão tais diferenças suficientemente profundas para sustentar a Tese do Desacordo, a ideia de que “há desacordos morais alargados e profundos que parecem persistentemente resistir à resolução racional” (p. 2)? E se a Tese do Desacordo estiver correcta, será que isso debilita a objectividade da ética? E como poderemos resolver os nossos desacordos morais se a Tese do Desacordo estiver correcta? Será que tudo o que conta é então a força das armas, dado que a razão nada tem a dizer, como insistem os pós-modernistas?
Nesta colectânea, o leitor é convidado a reflectir sobre estes temas. Gowans apresenta uma perspicaz selecção de ensaios e uma longa e informativa introdução. O livro tem cinco partes. A parte I (“O Debate Histórico”) apresenta textos de Sexto Empírico, Tomás de Aquino, Montaigne, Hume e Nietzsche. Para se poder apresentar um argumento a favor do relativismo moral baseado no desacordo moral é necessário haver realmente provas antropológicas de desacordos morais profundos entre as sociedades. Mas as coisas não são assim tão simples. Há sem dúvida desacordos morais, mas o seu significado preciso é controverso. A parte II (“Algumas Vozes da Antropologia”) apresenta três textos de antropólogos: Chagnon, Shweder e Turner. As provas antropológicas não parecem implicar por si o relativismo moral. Turner defende de forma convincente que “A mera existência de diferenças culturais não impede logicamente a possibilidade de universais culturais” (p. 118). A questão de saber se o respeito pelos direitos humanos e o relativismo são compatíveis é enfrentada em alguns dos textos e na introdução do organizador. E isto é muito útil, pois muitas pessoas aceitam o relativismo moral pensando que essa é a melhor maneira de defender a tolerância e uma abordagem mais humana das relações entre as nações. Mas isto é falso, pois um verdadeiro relativista terá de dizer que os direitos humanos são apenas princípios éticos relativos, como quaisquer outros princípios éticos, incluindo a tolerância e o respeito pela autonomia e liberdade das pessoas.
Um não-relativista radical quer mais do que apenas universais culturais. Quer defender não apenas que é um facto que por acaso todos os seres humanos partilham um núcleo de princípios éticos, mas também que se por acaso acontecesse partilharmos um núcleo diferente de princípios éticos, estaríamos errados. Este é o tipo de não-relativismo profundo que Bernard Williams e outros filósofos pensam ser falso. A parte III (“Desafios à Objectividade Moral”) apresenta textos de Mackie, Bernard Williams e David Wong que discutem as implicações filosóficas dos desacordos morais. As partes IV (“Defesas da Objectividade Moral”) e V (“Novas Direcções”) apresentam ensaios de David Brink, Martha Nussbaum, Alan Gewirth, Isaiah Berlin, MacIntyre, Rawls e Uma Narayan.
Em suma, Gowans oferece ao leitor uma boa antologia de ensaios sobre um problema importante, juntamente com uma lúcida introdução. É difícil discordar quanto ao valor deste livro, mas talvez o leitor queira ajuizar por si, lendo-o. Em matérias filosóficas não faltam desacordos sobre praticamente tudo, incluindo este comentário.