A filosofia da mente não trata apenas da análise filosófica de conceitos mentais ou psicológicos. Está também intimamente relacionada com problemas metafísicos. A metafísica – que tem sido tradicionalmente considerada a raiz de toda a filosofia – é a investigação sistemática da estrutura mais fundamental da realidade. Inclui, como uma importante subdivisão, a ontologia: o estudo acerca de quais categorias gerais de coisas existem ou poderiam existir. A filosofia da mente está relacionada com a metafísica porque precisa dizer algo sobre o estatuto ontológico dos sujeitos de experiência e seu lugar no esquema mais amplo de coisas. Nenhuma ciência particular – nem mesmo a física, muito menos a psicologia – podem roubar o papel da metafísica, porque toda a ciência particular pressupõe um quadro metafísico no qual interpreta os seus resultados experimentais. Sem uma concepção geral coerente do todo da realidade, não podemos ter a esperança de tornar compatíveis as teorias e observações das muitas e diferentes ciências: e fornecer tal concepção não é a tarefa de qualquer uma daquelas ciências, mas sim da metafísica.
Algumas pessoas pensam que a era da metafísica já passou, e que aquilo que os metafísicos pretendem alcançar é um sonho impossível. Alegam que é uma ilusão supor que os seres humanos podem formular e justificar uma imagem não distorcida da estrutura fundamental da realidade – ou porque a realidade é inacessível para nós ou então porque seria um mito supor que exista, afinal de contas, uma realidade independente de nossas crenças. A estes céticos respondo que o exercício da metafísica é inevitável para qualquer ser racional e que eles mesmos demonstram isso nas objeções que levantam contra ela. Dizer que a realidade é inacessível para nós ou que não há qualquer realidade independente de nossas crenças é apenas fazer uma afirmação metafísica. E se responderem admitindo-o mas, ao mesmo tempo, negando que eles ou qualquer outra pessoa possa justificar afirmações metafísicas por meio de argumentos cuidadosamente pensados, então minha resposta é dupla. Primeiramente, a menos que possam apresentar alguma razão para pensar que as afirmações metafísicas nunca são justificáveis, não vejo por que deveria eu aceitar o que eles dizem sobre isto. Em segundo lugar, se pretendem abandonar completamente os argumentos cuidadosamente pensados, mesmo aqueles em defesa das suas próprias posições, então não tenho nada mais a dizer-lhes porque se excluíram de qualquer debate adicional.
A metafísica é inevitável para qualquer pensador racional, mas isto não quer dizer que o pensamento e o raciocínio metafísicos sejam fáceis ou infalíveis. A certeza absoluta não é mais alcançável em metafísica do que o é em qualquer outro campo de investigação racional, e é injusto criticar a metafísica por falhar em fornecer aquilo que não se espera que nenhuma outra disciplina – nem mesmo a matemática – forneça. Tampouco a boa metafísica é conduzida à parte das investigações empíricas. Se quisermos saber sobre a estrutura fundamental da realidade, não podemos ignorar o que os cientistas empíricos bem informados nos contam sobre o que, em sua opinião, existe no mundo. No entanto, a ciência pretende apenas estabelecer o que de fato existe, dadas as provas empíricas que temos disponíveis. Ela nem pretende e nem pode nos dizer o que poderia ou não poderia existir, muito menos o que deveria existir, pois estas são questões que vão além do escopo de qualquer prova empírica. Contudo, a ciência em si só pode usar a prova empírica para estabelecer o que existe de fato à luz de uma concepção coerente do que poderia ou não poderia existir, porque a prova empírica só pode ser prova para a existência de coisas das quais a existência é no mínimo genuinamente possível. E fornecer tal concepção é uma das tarefas principais da metafísica.1
O objetivo destas observações é enfatizar que não pode haver progresso seja na filosofia da mente seja na psicologia empírica se a metafísica for ignorada ou abandonada. Os métodos e descobertas dos psicólogos empíricos e outros cientistas, por mais valiosos que sejam, não substituem a metafísica nas investigações do filósofo da mente. Tampouco deveria a nossa metafísica estar servilmente subordinada à moda científica predominante. Os cientistas têm inevitavelmente suas próprias crenças metafísicas, frequentemente não-ditas e não-refletidas, mas para um filósofo seria uma completa renúncia da responsabilidade filosófica adotar a perspectiva metafísica de um grupo de cientistas apenas em respeito à sua importância como cientistas. Teremos a oportunidade para atender a este aviso de tempos em tempos no nosso exame dos problemas que filosofia da mente nos coloca.
Explico em mais detalhes as minhas opiniões sobre a metafísica e as sua importância no meu livro The possibility of Metaphysics: Substance, Identity and Time (Oxford: Clarendon Press, 1998), ch. 1. ↩︎︎