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Crítica
1 de Outubro de 2016   Filosofia política

A ética e a racionalidade do ato de votar

Jason Brennan
Tradução de Aluízio Couto

Este verbete tem como foco seis perguntas de grande importância a respeito da ética e da racionalidade do ato de votar:

  1. Do ponto de vista de um cidadão individual, é racional votar?
  2. Há um dever moral de votar?
  3. Há obrigações morais a respeito de como os cidadãos votam?
  4. É justificado os governos obrigarem os cidadãos a votar?
  5. É permissível comprar, trocar ou vender votos?
  6. Quem deveria ter o direito de votar, e todos os cidadãos deveriam ter o mesmo direito ao voto?

A pergunta 6 diz respeito ao problema mais amplo de definir se as formas democráticas de governo são preferíveis às alternativas. Para uma discussão mais longa sobre a justificação da democracia, ver Christiano (2006). Ver também Pacuit (2011) para uma discussão sobre qual método de votação é o que reflete de forma mais adequada a “vontade do grupo”. Ver Gosseries (2005) para uma discussão dos argumentos favoráveis e contrários ao voto secreto.

1. A racionalidade do ato de votar

O ato de votar tem um custo de oportunidade. Consome tempo e esforço que poderiam ser usados para outras coisas valiosas, como o trabalho remunerado, a participação voluntária em um sopão beneficente ou o video game. Além disso, identificar os assuntos relevantes, coletar informação política, pensar e deliberar sobre esse conteúdo e por aí em diante também exigem tempo e esforço que poderiam ser usados para outros fins valiosos. Em sua forma mais simples, a economia prevê que as pessoas racionais agirão apenas quando fazê-lo maximiza a utilidade esperada. Aparentemente, no entanto, ao menos à primeira vista, o ato de votar não maximiza a utilidade esperada de quase nenhum dos cidadãos. Isso leva ao “paradoxo do voto” (Downs 1957): uma vez que os custos esperados (o que inclui os custos de oportunidade) de votar parecem maiores do que os benefícios esperados, e uma vez que os eleitores sempre podem decidir praticar outra ação qualquer cuja utilidade geral é positiva, é surpreendente que alguém vote.

A racionalidade ou irracionalidade do ato de votar depende, no entanto, do que os eleitores estão efetivamente tentando fazer ao votar. Teorias instrumentais da racionalidade dessa ação sustentam que pode ser racional praticá-la quando o objetivo do eleitor é o de influenciar ou mudar o resultado de uma eleição, o que inclui o “mandato” recebido pelo candidato vencedor. (A teoria do mandato sustenta que a eficácia de um candidato que chega ao cargo, i.e., a capacidade para colocar em prática as suas intenções, é em parte função do quão grande ou pequena era a vantagem sobre os concorrentes na eleição.) Em contraste, a teoria expressivista do voto sustenta que os eleitores votam para se expressar ou para expressar sua fidelidade a certos grupos e ideias.

1.1. Votar para alterar o resultado

Uma razão pela qual alguém pode votar é a perspectiva de influenciar ou alterar o resultado de uma eleição. Suponha que há dois candidatos, D e R. Suponha que Sally prefere D a R; ela acredita que D criaria um bem geral um trilhão de dólares maior do que R. Se sua crença for correta, então é melhor, por hipótese, que D vença.

No entanto, isso ainda não mostra que, da perspectiva de Sally, é racional votar em D. Isso depende da probabilidade que o seu voto tem de fazer a diferença. De forma muito parecida, o prêmio de uma loteria pode ser de 200 milhões de dólares, mas isso não implica que é racional comprar um bilhete de loteria.

Suponha que o único objetivo de Sally ao votar é alterar o resultado da eleição entre os dois candidatos mais fortes. Nesse caso, o valor esperado de seu voto (Uv) é:

Uv = p[V(D) - V(R)] - C

em que p representa a probabilidade de o voto de Sally ser decisivo, [V(D) - V(R)] representa (em termos monetários) a diferença do valor esperado dos dois candidatos e C representa os custos de oportunidade de votar. Em suma, o valor de seu voto é o valor da diferença entre os dois candidatos descontando a probabilidade de ser decisivo menos o custo de oportunidade. Desse modo, votar é de fato como comprar um bilhete de loteria. A menos que p[V(D) - V(R)] > C, é irracional (dado o objetivo declarado de Sally) fazê-lo.

Há algum debate entre economistas e cientistas políticos sobre a forma precisa de calcular a probabilidade de um voto ser decisivo. Mesmo assim, concordam geralmente que a probabilidade de um voto individual típico em uma eleição típica desempatar o pleito é pequena. Tão pequena que o benefício esperado (i.e., p[V(D) - V(R)]) de um voto num bom candidato vale menos do que a milionésima parte de um centavo (G. Brennan e Lomasky 1993: 56–57, 119). A estimativa mais otimista na bibliografia afirma que numa eleição presidencial, um eleitor americano pode ter uma probabilidade de desempate de 1 em 10 milhões, mas apenas se viver em algum dos três ou quatro “estados decisivos” e apenas se votar no candidato de um dos grandes partidos (Edlin, Gelman e Kaplan 2007). Assim, nesses dois modelos populares, do ponto de vista da maioria dos eleitores na maioria das eleições, é irracional votar com o propósito de alterar o resultado da eleição. Os custos esperados excedem os benefícios esperados por várias ordens de magnitude.

1.2. Votar para alterar o “mandato”

Uma resposta popular ao paradoxo do voto é afirmar que os eleitores não tentam determinar quem vence. Querem é alterar o “mandato” que o candidato eleito recebe. O pressuposto aqui é que a eficácia de um candidato eleito – i.e., sua capacidade para, no exercício do mandato, colocar em prática as suas intenções – depende em parte da dimensão da maioria de votos que recebeu. Se isso for verdadeiro, posso votar em quem desejo que vença a eleição a fim de fortalecer o seu mandato ou votar contra o provável vencedor a fim de enfraquecê-lo. A virtude dessa hipótese, caso seja verdadeira, é que pode explicar a razão pela qual seria racional votar mesmo em eleições nas quais um candidato tem grande vantagem.

O argumento do mandato, no entanto, enfrenta dois grandes problemas. Em primeiro lugar, mesmo se aceitarmos que os mandatos funcionam dessa forma, teríamos ainda de saber, para determinar a racionalidade do ato de votar, o quanto o enésimo voto de um dado eleitor fortalece a eficácia marginal do seu candidato preferido ou reduz a eficácia marginal do candidato a quem se opõe. Suponha que votar no provável vencedor custe 15 dólares do meu tempo. Seria racional votar somente se eu tivesse razões para pensar que o meu voto daria ao candidato o equivalente a 15 dólares de eficácia eleitoral (aceitando que me preocupo com o fortalecimento da eficácia na mesma medida ou mais do que me preocupo com os meus custos de oportunidade). Em princípio, a capacidade dos votos individuais para alterar o “mandato” nessa quantidade é algo que os cientistas políticos poderiam medir. E, de fato, é o que têm tentado fazer.

Mas isso nos leva ao segundo problema, este mais profundo: os cientistas políticos produziram um extenso trabalho empírico a fim de testar essa hipótese. No entanto, rejeitam-na fortemente (Dahl 1990b; Noel 2010). A capacidade de um candidato vencedor de colocar em prática as suas intenções não é, em geral, afetada pelo tamanho da margem de sua vitória eleitoral.

Talvez votar seja racional não como uma tentativa de alterar a eficácia de um político eleito, mas, em vez disso, como uma forma de tentar alterar o tipo de mandato que o candidato vencedor terá (Guerrero 2010). Talvez um voto possa transformar o candidato, visto como um delegado, num depositário. Um delegado tenta fazer o que pensa que os seus eleitores querem, mas um depositário tem legitimidade normativa para fazer o que ele pensa ser o melhor.

Suponha, para fins de argumentação, que os depositários são significativamente mais valiosos do que delegados, e que aquilo que transforma um dado representante num depositário é a sua grande margem de vitória. Infelizmente, isso ainda não mostra que os benefícios esperados de votar excedem os custos. Suponha (como em Guerrero 2010: 289) que a distinção entre um delegado e um depositário repousa num contínuo, como a distinção entre calvo e cabeludo. Para mostrar que é racional votar é necessário mostrar que o impacto marginal de um voto individual, à medida em que move o candidato um grau marginal a partir da posição de delegado para a de depositário, é maior do que o custo de oportunidade do ato de votar. Se o meu voto custa 15 dólares do meu tempo, então, nessa teoria, só seria racional votar se posso esperar que o meu voto desloque o meu candidato favorito da posição de delegado para a de depositário num incremento equivalente a 15 dólares (Guerrero 2010: 295–297).

Por outro lado, suponha que há um determinado limiar (conhecido ou desconhecido) de votos a partir do qual um candidato vencedor subitamente deixa de ser um delegado e se torna um depositário. Ao votar, o eleitor tem alguma probabilidade de dar o empurrão decisivo no seu candidato favorito para lá desse limiar. No entanto, tal como a probabilidade de o voto do eleitor decidir a eleição é terrivelmente pequena, a probabilidade de um voto transformar um delegado num depositário é terrivelmente pequena. De fato, a fórmula para determinar o quão decisivo é um voto na tarefa de transformar um delegado num depositário seria aproximadamente a mesma da que determina o poder de desempate de um voto. Assim, suponha que seja um bilião ou mesmo um trilião de vezes melhor que um representante seja um depositário em vez de um delegado. Mesmo assim, o benefício esperado de um voto individual é ainda menor do que 1 centavo, valor inferior ao custo de oportunidade do ato de votar. Mais uma vez, é maravilhoso ganhar na loteria, mas isso não significa que seja racional comprar o bilhete.

1.3. Outras razões para votar

Outros filósofos vêm tentando alterar o foco para modos alternativos em que podemos dizer que os votos individuais “fazem a diferença”. Talvez, ao votar, um eleitor tenha a probabilidade significativa de estar dentro do “conjunto causalmente eficaz” de votos ou de ser, por alguma razão, causalmente responsável pelo resultado (Tuck 2008; Goldman 1999).

Segundo essas teorias, o que um eleitor valoriza não é a alteração por meio do voto individual, mas a perspectiva de ser um agente que participou na causa de diferentes resultados. Essas teorias causais afirmam que votar é racional desde que o eleitor se preocupe em ser uma causa ou estar entre o que conjuntamente causa o resultado. Os eleitores votam porque querem ter o tipo correto de responsabilidade causal, por mais que sua influência individual seja pequena.

O que essas teorias alternativas deixam claro é que a racionalidade do ato de votar depende em parte de quais são os objetivos dos eleitores. Se objetivo é alterar o resultado da eleição ou alterar as políticas a serem implementadas, então votar é irracional, ou racional apenas em circunstâncias incomuns, ou do ponto de vista de um pequeno subconjunto de eleitores. Os eleitores, no entanto, talvez tenham outros objetivos.

A teoria expressivista do voto (G. Brennan e Lomasky 1993) sustenta que os eleitores votam para se expressar. Segundo a teoria, votar é uma atividade de consumo e não uma atividade produtiva; é mais como ler um livro por prazer do que ler para desenvolver uma nova competência. Dessa perspectiva, embora o ato de votar seja privado, os eleitores o consideram como um modo adequado de demonstrar e expressar comprometimento com a sua equipa política. Votar é como usar uma camisa dos Metallica num show ou fazer a “onda” num evento esportivo. Torcedores que pintam os rostos com as cores da equipa favorita geralmente não acreditam que podem individualmente alterar o resultado do jogo. O que querem é demonstrar o seu comprometimento com a equipa. Mesmo quando assistem aos jogos sozinhos, animam-se e aplaudem as suas equipas. Talvez o voto funcione de modo análogo.

A “teoria expressivista do voto” não apenas não é abalada como é parcialmente sustentada pelos dados empíricos de que a maioria dos eleitores ignora fatos políticos básicos (Somin 2013; Delli Carpini e Keeter, 1996). Da mesma forma, a teoria expressivista não é abalada, mas antes parcialmente suportada, pelas pesquisas em psicologia política cujos resultados mostram que a maior parte dos cidadãos sofre de um “viés intergrupos”: tendemos automaticamente a formar grupos e a ser irracionalmente leais e compreensivos com o nosso grupos; ao mesmo tempo, tendemos a detestar irracionalmente outros grupos (Lodge e Taber 2013; Haidt 2012; Westen, Blagov, Harenski, Kilts e Hamann 2006; Westen 2008). Ao adotar a sua ideologia, os eleitores podem sinalizar a si próprios e aos outros que são um dado tipo de pessoa. Suponha, por exemplo, que Bob quer expressar que é um cara patriota e durão. Apoia então ações militares agressivas, e.g., que os Estados Unidos ataquem a Rússia com bombas nucleares porque esta interferiu na Ucrânia. Seria um desastre para Bob se os Estados Unidos fizessem isso. No entanto, uma vez que o voto individual de Bob num candidato militarista tem poucas probabilidades de decidir o pleito, ele pode se locupletar com crenças irracionais e mal informadas sobre políticas públicas e expressar essas crenças nas urnas.

Outro argumento simples e plausível é o de que pode ser racional votar a fim de cumprir um dever que a pessoa julga ter (Mackie 2010). Pesquisas indicam que a maior parte dos cidadãos acreditam que há um dever de votar ou de “fazer a sua parte” (Mackie 2010: 8–9). Caso esses deveres existam e sejam suficientemente importantes, os eleitores podem votar racionalmente.

2. A obrigação moral de votar

As pesquisas mostram que a maior parte dos cidadãos nas democracias contemporâneas acredita que há algum tipo de obrigação moral de votar (Mackie 2010: 8–9). Outras pesquisas mostram que a maioria dos filósofos morais e políticos concorda com isso (Schwitzgebel e Rust 2010). Eles tendem a acreditar que os cidadãos têm um dever de votar mesmo quando acreditam corretamente que o seu partido ou candidato favorito não tem qualquer probabilidade real de vencer (Campbell, Gurin e Mill 1954: 195). Além disso, a maior parte das pessoas parece pensar que o dever de votar significa o dever de votar de alguma maneira (talvez um voto em branco) e não o dever de votar de um modo particular. Assim, as pessoas têm o dever de simplesmente depositar um voto, e praticamente qualquer voto de boa-fé é moralmente aceitável.

Muitos argumentos populares em favor do dever de votar se baseiam na ideia de que os votos individuais fazem uma diferença significativa. Pode-se argumentar, por exemplo, que há o dever de votar porque há o dever de se proteger, de ajudar os outros, de produzir um bom governo e por aí em diante. Esses argumentos, no entanto, enfrentam o problema, discutido na seção 1, de que os votos individuais têm um valor (ou desvalor) instrumental terrivelmente baixo.

Uma hipótese antiga, por exemplo, é que o voto pode ser uma forma de seguro destinado a impedir que a democracia entre em colapso (Downs 1957: 257). Seguindo essa sugestão, suponha que alguém avança a hipótese de que os cidadãos têm o dever de votar para ajudar a impedir que a democracia entre em colapso. Suponha que existe um limiar determinado de votos abaixo do qual a democracia se torna instável e de fato entra em colapso. O problema aqui é que, tal como há uma probabilidade terrivelmente pequena de qualquer voto individual decidir uma eleição, há uma probabilidade igualmente pequena de qualquer voto colocar o número de votos acima do limiar. Por outro lado, suponha que, à medida que menos cidadãos votam, a probabilidade de a democracia entrar em colapso se torna cada vez maior. Sendo assim, para mostrar que há um dever de votar, é necessário mostrar primeiro que o benefício marginal esperado do enésimo voto em reduzir as probabilidades de a democracia entrar em colapso excedem os custos (o que inclui os custos de oportunidade).

Qualquer argumento plausível em favor do dever de votar não depende do valor ou do impacto esperado dos votos individuais sobre o governo ou sobre a cultura cívica. Pelo contrário, um argumento plausível a favor do dever de votar precisa pressupor que os votos individuais fazem pouca diferença no resultado da eleição, e então identificar uma razão pela qual os eleitores deveriam mesmo assim votar.

Uma sugestão (Beerbohm 2012) é que os cidadãos devem votar para evitar a cumplicidade com a injustiça: os representantes agem em nome dos cidadãos. Estes contam como autores parciais das leis, mesmo quando não votam ou não participam do governo. Cidadãos que se recusam a votar são, assim, cúmplices por permitir que os seus representantes cometam injustiças. Omitir-se da tarefa de resistir à injustiça talvez conte como um tipo de patrocínio. (Esta teoria implica que os cidadãos não apenas têm o dever de votar e de não se abster, mas que têm especificamente o dever de votar em candidatos e políticas que reduzirão as injustiças.)

Outro argumento popular que não recorre à eficácia de votos individuais é o “argumento da generalização”:

E se todos ficassem em casa e não votassem? O resultado seria desastroso. Portanto, eu (você/ele) deveria votar. (Lomasky e G. Brennan 2000: 75)

Este argumento popular pode ser parodiado de um modo que expõe sua fragilidade. Considere:

E se todos ficassem em casa e não cultivassem? Morreríamos todos de fome! Portanto, eu (você/ele) deveria me tornar um agricultor. (Lomasky e G. Brennan 2000: 76)

O problema com o argumento, tal como apresentado, é que mesmo sendo desastrosa a situação em que ninguém ou poucas pessoas praticam alguma atividade, não se segue que todos deveriam praticá-la. Devemos apenas concluir que é importante que um número suficiente de pessoas o faça. No caso da agricultura, pensamos que é permissível dar às pessoas a probabilidade de decidir por elas próprias se vão se tornar agricultoras ou não, uma vez que os incentivos de mercado são suficientes para garantir que uma quantidade suficiente de pessoas se dedique à atividade.

No entanto, mesmo que o argumento da generalização não seja sólido, talvez aponte para algo importante. Há certas classes de ações que tendemos a supor que todos deveriam participar (ou não participar). Suponha, por exemplo, que uma universidade coloque uma placa com os seguintes dizeres: “Não pise na grama nova”. Não diríamos que a grama morrerá se apenas uma pessoa andar sobre ela. Se me fosse permitido andar sobre ela sempre que quisesse enquanto o resto de vocês não o faz, a grama provavelmente ficaria bem. Ainda assim, a universidade não dispensaria a todos um tratamento equânime caso concedesse a permissão somente a mim e a negasse a todos os outros. Parece mais apropriado impor igualmente a todos o dever de ficar fora do gramado. Da mesma forma, se o governo quer levantar dinheiro para fornecer um bem público, poderia simplesmente taxar aleatoriamente uma dada minoria de cidadãos. No entanto, parece mais equânime ou justo que todos (ou ao menos aqueles acima de certo limiar de renda) paguem os tributos e dessa forma compartilhem o ônus de fornecer proteção policial.

Devemos, então, perguntar o seguinte: o ato de votar é mais parecido com o primeiro tipo de atividade, em que a exigimos de um número suficiente de pessoas, ou com o segundo tipo, em que a exigimos de todos? Uma diferença entre os dois tipos de atividade é o que a abstenção faz aos outros. Se me abstenho do cultivo, não é por isso que tiro vantagem ou pego carona nos esforços dos agricultores. Na verdade, eu os compenso pela comida que consumo ao comprá-la numa economia de mercado. No segundo conjunto de casos, se caminho livremente pelo gramado enquanto todos os outros dão a volta, ou se me beneficio da proteção policial mas não pago os tributos, parece que então me aproveito dos esforços dos outros. Eles arcam com um fardo desproporcional e não compensado de manter a grama intacta ou de fornecer proteção policial. Aparentemente, estou tirando vantagem deles.

Um defensor do dever de votar pode, assim, argumentar que aqueles que não votam pegam carona na ação dos eleitores. Os que não votam se beneficiam do governo que os votos fornecem, mas não ajudam a fornecer esse governo.

Há ao menos alguns argumentos em favor do dever de votar que não dependem da suposição controversa de que os votos individuais fazem alguma diferença:

  1. O argumento da generalização/bens públicos/dívida para com a sociedade: Afirma que os cidadãos que se abstêm de votar pegam carona no fornecimento do bom governo ou não pagam as suas “dívidas para com a sociedade”.
  2. O argumento da virtude cívica: Afirma que os cidadãos têm o dever de exercer virtude cívica e por isso de votar.
  3. O argumento da cumplicidade: Afirma que os cidadãos têm o dever de votar (em favor de resultados justos) para não serem cúmplices das injustiças cometidas pelo seu governo.

Há, no entanto, uma dificuldade geral a esses argumentos: o problema da particularidade. Para mostrar que há um dever de votar não é suficiente mostrar um objetivo X que os cidadãos plausivelmente devem apoiar e então argumentar que o voto é uma maneira de apoiar ou ajudar a alcançar X. Em vez disso, os proponentes do dever de votar precisam mostrar que o voto é a única maneira, ou a maneira exigida, de apoiar X (J. Brennan 2011a). A suspeita aqui é que os três argumentos acima mostram apenas que votar é uma maneira entre várias de cumprir o dever. De fato, pode nem ser uma maneira especialmente boa e muito menos a única maneira obrigatória de cumprir o dever.

Suponha, por exemplo, que se argumente que os cidadãos devem votar porque devem exercer a virtude cívica. É preciso explicar por que o dever de exercer a virtude cívica implica o dever de votar e não o dever de praticar um dos milhares de atos possíveis de virtude cívica. Por outro lado, caso os cidadãos tenham o dever de ser agentes que ajudam a promover o bem-estar dos outros cidadãos, é provável que possam cumpri-lo por meio do trabalho voluntário, da arte ou do trabalho produtivo que gera excedente social. Se os cidadãos têm o dever de evitar a cumplicidade com injustiças, parece que, em vez de votar, podem promover a desobediência civil, escrever cartas para jornais, panfletos, livros políticos, doar dinheiro, abster-se de modo consciente, protestar, assassinar líderes políticos criminosos, etc. Não é clara a razão pela qual o voto é especial ou obrigatório.

3. Obrigações morais a respeito de como se vota

A maior parte das pessoas parece acreditar que há um dever de votar de alguma maneira (mesmo que seja em branco) ao invés de se abster (Mackie 2010: 8–9). Mas algo que ainda fica em aberto é se acreditam que há o dever de votar de algum modo particular. Alguns filósofos e teóricos políticos argumentam que há obrigações éticas ligadas a como se escolhe votar. Muitos democratas deliberativos (ver Christiano 2006) acreditam não apenas que todos os cidadãos têm o dever de votar, mas que, após participar de várias formas de deliberação democrática, têm o dever de votar munidos de espírito público. Em contraste, alguns (G. Brennan e Lomasky 1993; J. Brennan 2009; J. Brennan 2011a) argumentam que embora não haja qualquer dever geral de votar (a abstenção é permissível), os que escolhem votar têm deveres a respeito de como o fazem. Argumentam que embora a abstenção não seja errada, é errado votar de maneira ruim em algum sentido teoricamente especificado de “ruim”.

Repare que o problema de como se deve votar é distinto do problema de determinar se alguém deve ou não ter o direito ao voto. O direito ao voto dá aos cidadãos a licença de depositar um voto. Exige que o estado permita que o cidadão vote e exige daquele que conte o voto deste. Ainda fica em aberto se algumas maneiras de votar podem ser moralmente erradas ou se outras podem ser moralmente obrigatórias. Paralelamente, é defensável que o meu direito à livre associação inclui o direito de fazer parte da Ku Klux Klan, e é também defensável que o meu direito à liberdade de expressão inclui a defesa de uma guerra injusta. Mesmo assim, seria moralmente errado de minha parte fazer qualquer uma dessas coisas, por mais que fazê-las sejam direitos que me assistem. Assim, tal como alguém pode dizer sem se contradizer “Você tem o direito de se juntar ao KKK ou defender o genocídio, mas não deveria fazer essas coisas”, uma pessoa pode dizer sem se contradizer “Você tem o direito de votar naquele candidato, mas não deveria fazê-lo”.

Uma teoria da ética do ato de votar pode incluir respostas a qualquer uma das seguintes perguntas:

  1. O beneficiário pretendido do voto: De quem são os interesses que o eleitor deveria levar em consideração ao votar? O eleitor pode votar de modo egoísta, ou será que deveria votar levando em consideração os interesses das outras pessoas? Caso seja do último modo, em nome de que grupo deveria votar? Os seu(s) grupos(s) demográfico(s), a sua jurisdição local, a nação ou o mundo todo? É permissível votar quando o eleitor nada tem a perder ou a ganhar com a eleição, ou quando é indiferente ao resultado?
  2. A substância do voto: Há candidatos ou políticas particulares que o eleitor é obrigado a apoiar ou a não apoiar? Será que, por exemplo, o eleitor é obrigado a votar por qualquer coisa que produziria de forma mais eficaz os resultados mais justos, de acordo com a teoria correta da justiça? O eleitor deveria votar em candidatos com bom caráter? O eleitor pode votar estrategicamente, ou deve votar de acordo com suas preferências sinceras?
  3. Deveres epistêmicos a respeito do ato de votar: Deve-se exigir dos eleitores um determinado grau de conhecimento ou um tipo particular de racionalidade epistêmica ao formarem as suas preferências a respeito do voto? É permissível votar de modo ignorante, com base em crenças formadas sem dados suficientes sobre temas de ciências sociais?

3.1. A ética expressivista do ato de votar

Recorde que uma teoria importante do comportamento dos eleitores sustenta que a maior parte dos cidadãos vota não para influenciar o resultado da eleição ou as políticas governamentais, mas para se expressar (G. Brennan e Lomasky 1993). Votam para assinalar a si mesmos e aos outros que são leais a certas ideias, ideais ou grupos. Posso, por exemplo, votar no Partido Democrata para assinalar que sou compassivo e equânime, ou votar no Partido Republicano para assinalar que sou responsável, moral e durão. Se o voto é primariamente um ato expressivo, então talvez a ética do voto seja uma ética da expressão (G. Brennan e Lomasky 1993: 167–198). Podemos avaliar a moralidade do ato de votar ao perguntar o que nos diz sobre o eleitor:

Votar num membro do KKK é se identificar de modo moralmente significativo com as políticas racistas defendidas pela organização. A pessoa se sujeita à responsabilidade moral associada ao voto independentemente tanto de o candidato ter uma probabilidade pequena, grande ou nula de vencer quanto do impacto do voto no resultado da eleição. (G. Brennan e Lomasky 1993: 186).

A ideia aqui é que se é em geral errado (por mais que a ação esteja no âmbito dos meus direitos) que eu expresse atitudes racistas sinceras, é errado que expresse atitudes racistas sinceras nas urnas. Considerações similares se aplicam a outras atitudes erradas. Na medida em que é, de minha parte, errado expressar apoio sincero a ideias iliberais, temerárias ou más, seria também errado se eu votasse em um candidato que defende essas ideias.

Obviamente, o que conta exatamente como uma expressão moralmente errada e moralmente permissível é um problema complicado. Há o problema também complicado de determinar o que o voto expressa. O que penso que o meu voto expressa pode ser diferente do que ele expressa para os outros, ou talvez o voto expresse coisas diferentes para pessoas diferentes. A teoria expressivista da ética do voto reconhece essas dificuldades e responde que qualquer coisa que dissermos a respeito da ética da expressão em geral provavelmente deveria ser aplicado ao voto enquanto expressão.

3.2. A ética epistêmica do voto

Considere a seguinte pergunta: o que os médicos devem aos pacientes, os pais aos filhos, ou os jurados aos réus (ou talvez à sociedade)? Os médicos devem aos seus pacientes o cuidado apropriado, e para cumprir seus deveres, precisam 1) de ter o objetivo de promover os interesses dos pacientes e 2) de ponderar sobre como fazê-lo de modo suficientemente informado e racional. Os pais têm os mesmos deveres para com seus filhos. Da mesma forma, os jurados têm, para com a sociedade, ou talvez mais especificamente para com réu, os deveres de 1) tentar chegar à verdade e de 2) fazê-lo de forma informada e racional. Médicos, pais e jurados são fiduciários de terceiros. Têm um dever de cuidado, e esse dever de cuidado traz consigo certas responsabilidades epistêmicas.

Pode-se tentar argumentar que os eleitores têm deveres similares de cuidado para com os governados. Talvez os eleitores devam votar 1) em favor do que pensam que são os melhores resultados (consistentes com o voto estratégico) e 2) tomar tais decisões de modo suficientemente informado e racional. O modo como os eleitores votam tem impacto significativo nos resultados políticos e pode ajudar a definir questões de paz e guerra, vida e morte, prosperidade e pobreza. A maioria não escolhe apenas para si, mas para todos, incluindo minorias dissidentes, crianças, não-eleitores, estrangeiros residentes e pessoas em outros países afetadas pela decisão. Por essa razão, votar parece uma atividade com peso moral (Christiano 2006; Brennan 2011a; Beerbohm 2012).

Apesar disso, uma desanalogia clara entre a relação que os médicos têm para com os pacientes e os eleitores para com os governados é a de que os votos individuais têm apenas uma probabilidade terrivelmente pequena de fazer a diferença. O dano esperado de um voto individual incompetente é muitíssimo pequeno, ao passo que o dano esperado de decisões médicas individuais incompetentes é alto.

Mesmo assim, talvez o ponto se mantenha de qualquer modo. Seja uma “atividade coletivamente danosa” definida como uma atividade em que um grupo impõe ou ameaça impor dano, ou risco injusto de dano, a pessoas inocentes. O dano, porém, será imposto independentemente de membros individuais do grupo optarem por não agir. É plausível que haja uma obrigação de não participar de tais atividades, i.e., um dever de manter as mãos limpas.

Para ilustrar, suponha que um pelotão de fuzilamento com 100 membros esteja prestes a atirar numa criança inocente. Cada bala atingirá a criança ao mesmo tempo e cada tiro é, individualmente, suficiente para matá-la. Você não pode pará-los: a criança morrerá independentemente do que você faça. Suponha agora que eles lhe oferecem a oportunidade de juntar-se ao pelotão para matar a criança. Você pode dar o centésimo primeiro tiro. Repito: a criança morrerá independentemente disso. É permissível que você se junte ao pelotão? A maioria das pessoas têm uma intuição forte de que é errado juntar-se ao grupo e atirar na criança. Uma explicação plausível da razão pela qual isso é errado é que pode haver uma proibição moral geral contra a participação nesses tipos de atividade. Nesses tipos de caso, deveríamos manter nossas mãos limpas.

Talvez esse “princípio das mãos limpas” possa ser generalizado para explicar a razão pela qual os votos ignorantes, irracionais e maldosos são errados. O exemplo do pelotão de fuzilamento é de alguma forma análogo à votação numa eleição. Adicionar ou subtrair um atirador não faz diferença – a menininha morrerá de qualquer jeito. Da mesma forma, os votos individuais não fazem diferença. Em ambos os casos, o resultado está causalmente sobredeterminado. Mesmo assim, o eleitor irresponsável é em muitos aspectos como a pessoa que se oferece para o pelotão de fuzilamento. O seu mau voto individual não tem consequências – tal como um tiro individual não tem consequências –, mas ele participa de uma atividade coletivamente danosa, quando poderia muito bem manter as próprias mãos limpas.

4. A justiça do voto obrigatório

O participação eleitoral em muitas democracias contemporâneas está (segundo vários observadores) baixa e parece estar em geral caindo mais. Os Estados Unidos, por exemplo, mal alcançam 60% em eleições presidenciais e 45% noutras eleições (Brennan e Hill 2014: 3). Vários outros países têm índices igualmente baixos. Alguns teóricos da democracia, políticos e outros pensam que isso é um problema e defendem o voto obrigatório como uma solução. Num regime dessa natureza, os cidadãos são obrigados por lei a votar e, caso não o façam sem apresentar uma justificativa válida, recebem algum tipo de penalidade.

Um importante argumento em favor do voto obrigatório é o que poderia se denominar argumento demográfico ou argumento da representatividade (Lijphart 1997; Engelen 2007; Galston 2011; Hill em J. Brennan e Hill 2014: 154–173). O argumento começa por notar que em regimes de voto facultativo os cidadãos que escolhem votar são sistematicamente diferentes daqueles que se abstêm. Os ricos têm maior probabilidade de votar do que os pobres. Os velhos têm maior probabilidade de votar do que os jovens. O mesmo se aplica aos homens em relação às mulheres. Em muitos países, as minorias étnicas têm menor probabilidade do que maiorias. E, mais uma vez, o mesmo se aplica a pessoas mais educadas em relação às menos educadas, as casadas em relação às solteiras. Os militantes políticos, por sua vez, têm maior probabilidade de votar do que independentes (Leighley e Nagler 1992; Evans 2003: 152–156). Em suma, sob o regime de voto facultativo, o eleitorado – os cidadãos que de fato escolhem votar – não representam completamente o público em geral. O argumento demográfico sustenta que uma vez que os políticos tendem a dar aos eleitores o que estes querem, tenderão, num sistema de voto facultativo, a promover os interesses dos cidadãos favorecidos (que votam desproporcionalmente) sobre os desfavorecidos (que tendem a não votar). O voto obrigatório tenderia então a garantir que os desfavorecidos votassem em maior número e dessa forma provavelmente asseguraria que o interesse de todos fossem apropriadamente representados.

De forma relacionada, pode-se argumentar que o voto obrigatório ajuda os cidadãos a superar um “problema de garantia” (Hill 2006). A ideia aqui é que um eleitor individual vê que o seu voto tem pouco impacto. O importante, porém, é que um número suficiente de pessoas como ela votem. Como ela não pode coordenar a votação com os outros eleitores e assegurar que votarão com ela, a obrigatoriedade resolve o problema. Por essa razão, Lisa Hill (2006: 214–215) conclui que “em vez de ver a obrigatoriedade como mais uma forma inconveniente de coerção estatal, o voto obrigatório pode ser entendido de forma mais apropriada como uma necessidade de coordenação em sociedades de massa habitadas por estranhos incapazes de comunicar e coordenar as suas preferências”.

O sucesso do argumento demográfico depende de alguns poucos pressupostos sobre o comportamento dos eleitores e dos políticos. Em primeiro lugar, os cientistas políticos encontram provas esmagadoras de que os eleitores não votam de modo auto-interessado, mas em prol do que pensam ser o melhor interesse nacional. (Ver as dezenas de artigos citados em Brennan e Hill 2014: 38–9n28). Em segundo lugar, pode ser que os cidadãos desfavorecidos não estejam suficientemente informados para votar de modo a promover os seus próprios interesses – podem não ter conhecimentos suficientes de ciências sociais para saber quais são os candidatos ou partidos políticos que irão ajudá-los (Delli Carpini e Keeter 1996; Caplan 2007; Somin 2013). Em terceiro lugar, pode ser que mesmo em regimes de voto obrigatório os políticos consigam ignorar as preferências da maioria dos eleitores sem pagar por isso qualquer preço (Gilens 2012; Bartels 2010).

De fato, ao contrário da expectativa de muitos teóricos, parece que o voto obrigatório não tem qualquer efeito significativo no conhecimento político individual (isto é, não induz os eleitores ignorantes a se informarem melhor), na conversa e persuasão políticas, na propensão individual para contatar com políticos e na propensão para trabalhar em conjunto para resolver problemas. Também não tem qualquer efeito significativo na participação em atividades de campanha, na probabilidade de ser interpelado por um partido ou político, na qualidade da representação, na integridade eleitoral, na proporção de mulheres no parlamento, no apoio a partidos menores ou mais alternativos e no apoio à esquerda ou à extrema direita (Birch 2009, Highton e Wolfinger 2001). Os cientistas políticos têm também sido incapazes de demonstrar que o voto obrigatório leva a resultados mais igualitários ou a políticas públicas com tendências à esquerda. A bibliografia empírica até então mostra que o voto obrigatório leva as pessoas a votar, mas não é claro que faça muito mais do que isso.

5. A ética da compra de votos

Muitos cidadãos das democracias modernas acreditam que comprar e vender votos é imoral (Tetlock 2000). Muitos filósofos políticos concordam; argumentam que é errado comprar, trocar ou vender votos (Satz 2010; Sandel 2012: 104–105). Richard Hasen revisou a bibliografia sobre compra de votos e concluiu que as pessoas têm oferecido três argumentos principais contra a prática:

A despeito da condenação universal da compra de votos, os comentadores discordam a respeito das razões subjacentes para a sua proibição. Alguns oferecem um argumento igualitarista contra a compra de votos: os pobres têm maiores probabilidades de vendê-los do que os ricos, o que leva a resultados políticos que favorecem os ricos. Outros oferecem um argumento contra a compra de votos que recorre à eficiência: a prática permite que os compradores engajem em comportamento rentista, o que diminui a prosperidade social. Finalmente, alguns comentadores oferecem um argumento cuja motivação é a inalienabilidade dos votos: os votos pertencem à comunidade como um todo e não podem ser alienados por eleitores individuais. Esse argumento pode dar suporte a uma norma anti-comodificação cujo efeito é fazer os eleitores tomarem decisões dotadas de espírito público. (Hasen 2000: 1325)

Duas dessas preocupações são consequencialistas: num regime no qual a compra de votos é legal, os votos serão comprados e vendidos de modo socialmente destrutivo. No entanto, se isso será ou não assim é matéria de um sério debate em ciências sociais. Alguns economistas pensam que um mercado de votos produziria de fato mais eficiência (Buchanan e Tullock 1962; Haefele 1971; Mueller 1973; Philipson e Snyder 1996; Hasen 2000: 1332). A terceira preocupação é deontológica: os votos não são o tipo de coisa que deveria ser colocada à venda mesmo que a sua compra e venda não tivesse más consequências.

Muitos pensam que a venda de votos é errada porque levaria ao mau voto ou ao voto corrupto. Mas, se é esse o problema, então talvez a permissibilidade de comprar e vender votos devesse ser avaliada caso a caso. Talvez a correção ou o erro de atos individuais de compra e venda dependa inteiramente de como o vendedor vota (J. Brennan 2011a: 135–160; Brennan e Jaworski 2015: 183–194). Suponha que pago a uma pessoa para votar de um modo benéfico. Suponha, por exemplo, que pago a pessoas indiferentes para que votem em favor dos direitos das mulheres ou em prol da Teoria Correta da Justiça, seja lá qual for. Ou suponha que do meu ponto de vista há demaisadas pessoas que não votam, e assim pago a pessoas bem informadas para votar segundo a sua consciência. Não é clara a razão por que devemos concluir que fiz algo errado em vez de concluir que, na verdade, prestei a todos um pequeno serviço público.

Certas objeções à compra e venda parecem provar demais; essas objeções levam a conclusões que os objetores não estão dispostos a apoiar. Um argumento comum contra a venda de votos é que pagar uma pessoa para votar impõe uma externalidade sobre terceiros. No entanto, o mesmo ocorre quando se persuade alguém a votar de determinada maneira (Freiman 2014: 762). Se pagar-lhe para votar em X é errado porque impõe custos a terceiros, então, por uma questão de consistência, devo também concluir que persuadi-lo a votar em X com base num bom argumento é também problemático.

Eis outro exemplo: alguns objetam o mercado de votos com base na ideia de que os votos deveriam ser dados pelo bem comum, e não em prol do auto-interesse particular (Satz 2010: 103; Sandel 2012: 10). Outros dizem que o ato de votar deveria “ser praticado apenas depois de uma deliberação coletiva a respeito do que é o bem comum” (Satz 2010: 103). Alguns afirmam que o mercado de votos deveria ser ilegal por essa razão. Talvez seja permissível proibir a venda de votos porque os votos tratados como mercadorias têm maior probabilidade de atentar contra o bem comum. No entanto, se isso é suficiente para proibir o mercado de votos, não é claro por que não deveríamos proibir o voto a eleitores altamente ignorantes, irracionais ou egoístas, dado que os seus votos também têm bastante probabilidade de enfraquecer o bem comum (Freiman 2014: 771–772). Além disso, esses argumentos parecem permitir que uma pessoa legitimamente venda seu voto, deste que o faça após deliberação e pelo bem comum. Talvez, a maioria ou mesmo todos os votos fossem destrutivos caso a venda de votos fosse legal, mas isso não mostra que a sua venda é inerentemente errada.

6. A quem deveria ser permitido Votar? Será que todos deveriam receber direitos iguais de voto?

A perspectiva dominante entre os filósofos políticos é que devemos ter algum tipo de democracia representativa e que cada adulto deve ter um voto de peso igual ao de todos os outros adultos em qualquer eleição em dada jurisdição. Essa perspectiva é alvo de críticas tanto de aliados quanto de críticos da democracia.

Antes mesmo de perguntar se “uma pessoa, um voto” é o tipo correto de política, é preciso determinar quem compõe o demos. Chamemos isso de o “problema da fronteira” ou o “problema de determinar a constituição do demos” (Goodin 2007: 40). A democracia é o governo do povo. Mas um problema fundamental é quem, afinal, é “o povo”. Não se trata de um problema menor. Antes de poder julgar que a democracia é um regime equânime ou que responde adequadamente aos interesses dos cidadãos, precisamos saber quem “conta” e quem não conta.

Pode-se dizer que todos os que vivem sub uma dada jurisdição governamental são parte do demos e têm a prerrogativa de votar. No entanto, a maioria das democracias negam o voto a crianças e adolescentes, condenados, doentes mentais e estrangeiros residentes, mas ao mesmo permitem o voto a cidadãos nacionais residentes noutros países (López-Guerra 2014: 1).

Há algumas teorias concorrentes aqui. A teoria dos “interesses de todos os afetados” (Dahl 1990a: 64) sustenta que todos os afetados por decisões políticas ou por instituições políticas são parte do demos. O argumento básico é que todos os afetados por um processo de tomada de decisão política deveria ter voz a respeito do processo. O princípio, porém, tem vários problemas. Pode ser incoerente ou inútil, pois podemos não saber ou não ser capazes de saber quem é afetado pela decisão até ela ser tomada (Goodin 2007: 52). Por exemplo (tirado de Goodin 2007: 53), suponha que os eleitores britânicos votam a favor ou contra a transferência de 5% de seu PIB para as suas ex-colônias africanas. Não podemos avaliar se os membros dessas ex-colônias estão entre os interesses afetados até sabermos qual é o resultado da votação. Se o voto for “bora!”, eles serão afetados; se for “nope!”, não são afetados. (Ver Owen 2012 para uma resposta.) Além disso, a teoria dos “interesses de todos os afetados” frequentemente incluiria não-cidadãos e excluiria cidadãos. Às vezes as decisões políticas tomadas num país têm efeito significativo sobre os cidadãos de outro país; às vezes as decisões políticas tomadas num país têm pouco ou nenhum efeito sobre os cidadãos desse mesmo país.

Uma solução (Goodin 2007: 55) para esse problema (de quem conta como uma parte afetada) é sustentar que todas as pessoas com interesses possivelmente afetados contam. Esse princípio implica, no entanto, que, para muitas decisões, o demos é menor do que o estado-nação; para outras decisões, é maior. Quando os Estados Unidos, por exemplo, decidem se elegerão um candidato belicoso ou um pacifista, isso afeta não apenas os americanos, mas uma enorme porcentagem de pessoas em todo o mundo.

Outras teorias relevantes oferecidas como soluções para o problema da fronteira enfrentam problemas semelhantes. A teoria da coerção, por exemplo, sustenta que todos os que estão sujeitos à coerção por parte do corpo político devem ter uma voz (López-Guerra 2005). Mas esse princípio também pode ser visto como ultra-inclusivo (Song 2009), pois exigiria a concessão do direito ao voto a estrangeiros residentes, turistas e até mesmo a combatentes inimigos. Afinal, todos estão sujeitos ao poder coercitivo do estado. Além disso, quem será coagido ou não depende dos resultados de uma decisão. Se o estado decide impor certas leis, coagirá certas pessoas. Se, por outro lado, optar por não impor tais leis, não haverá coerção. Se tentarmos contornar o problema defendendo que qualquer pessoa potencialmente sujeita ao poder coercivo do estado deveria ter voz, isso parece implicar que quase todos em todo o mundo deveriam ter voz na maioria das decisões importantes tomadas pelos países.

A perspectiva de senso comum do demos, i.e., de que o demos inclui todos e apenas os membros adultos do estado-nação, pode ser difícil de defender. Goodin (2007: 49) propõe que o que torna os cidadãos especiais é o fato de os seus interesses estarem interligados. Isto pode ser uma característica acidental decidida arbitrariamente pelas fronteiras nacionais, mas depois de essas fronteiras estarem em vigor, os cidadãos pensarão que os seus interesses tendem a estar mais ligados entre si do que aos interesses de pessoas de outros lugares. Mas se isto é verdadeiro ou não é algo altamente contingente.

6.1. Desafios democráticos à ideia de “uma pessoa, um voto”

A ideia de “uma pessoa, um voto” fundamenta-se supostamente num compromisso com o igualitarismo. Alguns filósofos acreditam que a democracia com direitos de voto iguais é necessária para garantir que o governo considere da mesma forma os interesses de todos (Christiano 1996, 2008). Não é claro, no entanto, que a concessão a todos dos mesmos direitos de voto garante decisões que consideram igualmente os interesses de todos. No caso de várias decisões, há um bom número de cidadãos que não têm muito a perder ou ganhar, enquanto outros têm e muito. Assim, uma proposta alternativa é que os votos tenham um peso estabelecido pelo que os eleitores têm a perder ou a ganhar com a decisão. Isso preserva a igualdade não por dar a todos uma probabilidade igual de ser decisivo em todas as decisões, mas por dar a todos os interesses o mesmo peso. Do contrário, num regime no qual vigora o princípio “uma pessoa, um voto”, matérias que são profundamente importantes para uma minoria podem ser derrotadas por questões de pouco interesse para a maioria (Brighouse e Fleurbaey 2010).

Há outros argumentos independentes em favor dessa conclusão. Talvez o voto proporcional fortaleça a autonomia dos cidadãos por lhes dar mais controle sobre os temas aos quais atribuem grande importância, ao passo que poucos entre os restantes considerariam que ter menos controlo sobre esses temas, de interesse reduzido para esse segundo grupo, é uma perda significativa de autonomia. Além disso, embora o argumento em favor dessa conclusão seja técnico demais para incluí-lo em detalhe aqui (Brighouse e Fleurbaey 2010; List 2013), pode ser que a partilha do poder político de acordo com a importância do resultado contorne vários paradoxos da democracia bem conhecidos, tal como o paradoxo de Condorcet (que mostra que as democracias podem ter preferências intransitivas, i.e., a maioria prefere A a B, B a C e no entanto também prefere C a A).

Entretanto, por mais que a proposta pareça plausível na teoria, não é claro o modo como uma democracia pode instanciá-la confiavelmente na prática. Antes de permitir o voto, um governo democrático teria de determinar em que medida diferentes cidadãos ganham ou perdem com uma decisão, e então de alguma forma pesar os votos proporcionalmente. Na vida real, grupos de interesse e outros provavelmente tentariam usar o peso dos votos para os seus próprios fins. Por fim, os cidadãos podem considerar os direitos desiguais ao voto como sinal de corrupção e manipulação eleitoral (Christiano 2008: 34–45).

6.2. Desafios não-democráticos à ideia de “uma pessoa, um voto”

Os defensores mais antigos da democracia estavam preocupados em mostrar que a democracia é superior à aristocracia, monarquia e oligarquia. No entanto, mais recentemente, a epistocracia emergiu como um oponente à democracia (Estlund 2003, 2007; Landemore 2012). Diz-se que um regime é epistocrático na medida em que atribui formalmente o poder político com base no conhecimento ou competência política. Uma epistocracia, por exemplo, pode dar a pessoas educadas em universidades mais votos (Mill 1861), negar o voto a certos cidadãos a menos que sejam aprovados num exame de qualificação eleitoral, atribuir peso ao valor do voto de cada eleitor segundo o grau de conhecimento político (corrigindo as influências de fatores demográficos) ou criar painéis de especialistas cujos membros tenham o direito de vetar legislação democraticamente criada (Caplan 2007; J. Brennan 2011b; López-Guerra 2014; Mulligan 2015).

Argumentos em favor da epistocracia se centram geralmente no problema da incompetência democrática. Os epistocratas sustentam que a democracia atribui ao cidadão o direito de votar de modo promíscuo. Uma ampla pesquisa empírica tem mostrado que os níveis médios, medianos e comuns de conhecimento político (isso sem falar no conhecimento científico) entre os eleitores é extremamente baixo (Somin 2013; Caplan 2007; Delli Carpini e Keeter 1996). Além disso, o conhecimento político faz muita diferença em como os cidadãos votam e que tipo de políticas públicas apoiam (Authaus 1998, 2003; Caplan 2007; Gillens 2012). Os epistocratas acreditam que restringir ou atribuir peso aos votos serviria como uma proteção contra as desvantagens da incompetência da democracia.

Um argumento em favor da epistocracia é o de que a legitimidade das decisões políticas dependem do fato de serem feitas de modo competente e de boa-fé. Considere a seguinte analogia: num julgamento criminal, a decisão do júri é muitíssimo importante. A decisão pode cassar os direitos de alguém ou prejudicar severamente sua vida, liberdade, bem-estar e propriedade. Se um júri decidisse de forma ignorante, maldosa, caprichosa ou com base em procedimentos epistêmicos irracionais e enviesados, é defensável que não deveríamos considerar que a decisão tem autoridade e legitimidade. E provavelmente não consideraríamos. Pelo contrário, pensamos que o criminoso tem direito a um julgamento conduzido por pessoas competentes e de boa-fé. Em muitos aspectos, as decisões eleitorais são similares às decisões de júris: há muito a ganhar ou a perder e inocentes podem perder a vida, liberdade, bem-estar ou propriedade. Se a legitimidade e a autoridade de uma decisão do júri depende deste tê-la tomado de modo competente e de boa-fé, então talvez o mesmo deveria valer para a legitimidade e autoridade da maior parte das outras decisões governamentais, o que inclui decisões tomadas por eleitores e representantes. À luz da disseminação da ignorância e irracionalidade políticas, suponha que os eleitorados democráticos tendam a tomar decisões incompetentes. Neste caso, isso parece fornecer ao menos uma presunção favorável à epistocracia sobre a democracia (J. Brennan 2011b).

Alguns disputam a ideia de que a epistocracia teria um desempenho superior à da democracia mesmo em princípio. A epistocracia procura gerar resultados políticos melhores ao aumentar de alguma forma a confiabilidade média daqueles que tomam as decisões políticas. Os cientistas políticos Lu Hong e Scott Page (2004) deduziram um teorema matemático que mostra que, nas condições certas, a diversidade cognitiva entre os participantes numa decisão coletiva contribui mais para uma tomada de decisão de grupo inteligente do que o aumento da confiabilidade de cada participante individual. Segundo o teorema Hong-Page, é possível que um grande número de decisores não-confiáveis, embora diversos, deliberando num contexto de decisão coletiva, supere um corpo decisório formado por menos decisores, só que mais confiáveis. A substância matemática do teorema Hong-Page é objeto de algum debate (Thompson 2014 afirma que não há substância). Debate-se também se as decisões políticas do mundo real satisfazem as condições do teorema e, caso o façam, em que medida isso justifica o sufrágio universal ou meramente mostra que um sufrágio restrito em alguma medida é superior a um sufrágio altamente restritivo (Landemore 2012; Somin 2013: 113–115).

Relacionado a isso, o teorema do júri, de Condorcet, sustenta que sob as condições adequadas, desde que o eleitor médio seja confiável, quanto mais eleitores participam da decisão coletiva, a probabilidade de que a democracia fará a escolha certa se aproxima de 1 (List e Goodin 2001). No entanto, supondo que o teorema se aplica a decisões democráticas reais, o apoio ou a condenação da democracia com base nele dependerá de quão confiáveis são os eleitores. Se os eleitores se saem sistematicamente pior do que o acaso (e.g., Althaus 2003; Caplan 2007), então o teorema implica que democracias de grande porte quase sempre fazem a escolha errada.

Um possível temor acerca de certas formas de epistocracia, tais como o regime em que o direito ao voto é condicionado a um exame, é que sejam tomadas decisões enviesadas em favor de membros de certos grupos demográficos. Afinal, o conhecimento político não está igualmente distribuído entre todos os grupos demográficos. Em média, nos Estados Unidos, segundo medições de conhecimento político básico, os brancos sabem mais do que os negros, os residentes do nordeste sabem mais do que os residentes do sul, os homens sabem mais do que as mulheres, as pessoas de meia idade sabem mais do que os jovens ou os velhos e as pessoas com rendas elevadas sabem mais do que os pobres (Delli Carpini e Keeter 1996: 137–177). Se um exame eleitoral fosse implementado, o eleitorado resultante seria mais branco, mais masculino, mais rico, de meia idade e mais bem empregado do que a população em geral. Os democratas têm razões para temer que por essa razão a epistocracia não levaria em devida consideração os interesses dos não-brancos, das mulheres, dos pobres e dos desempregados.

Uma forma de epistocracia, no entanto, talvez seja capaz de evitar essa objeção. Considere, por exemplo, a “loteria do sufrágio”:

A loteria do sufrágio consiste em dois dispositivos. Em primeiro lugar, haveria um sorteio para cassar o sufrágio da vasta maioria da população. Antes de qualquer eleição, com exceção de uma amostra do público, todos seriam excluídos. Chamo a esse dispositivo “sorteio excludente” porque meramente nos diz quem não poderá votar em dado pleito. De fato, aqueles que sobrevivem ao sorteio (os pré-eleitores) não teriam automaticamente direito de voto. Tal como todos no grupo maior ao qual pertencem, os pré-eleitores supostamente seriam insuficientemente competentes para votar. É aqui que o segundo dispositivo entra em cena. Para serem agraciados com o sufrágio e, enfim, votar, os pré-eleitores se reuniriam em grupos relativamente pequenos a fim de participar de um processo rigorosamente projetado para otimizar o seu conhecimento sobre as alternativas em disputa. (López-Guerra 2014: 4; cf. Ackerman e Fishkin 2005)

Sob esse arranjo, ninguém tem qualquer direito presumível ao voto. Todos têm, à partida, a mesma elegibilidade de serem selecionados e se tornarem eleitores. Antes de o sorteio ocorrer, os candidatos fariam campanha da mesma forma que fazem nas democracias. No entanto, fariam campanha sem saber quais os cidadãos que irão adquirir o direito ao voto. Imediatamente antes da eleição, um conjunto aleatório mas representativo de eleitores é então selecionado pela loteria. Não é automaticamente dado a esses cidadãos o direito de votar. Eles adquirem apenas uma permissão para ter esse direito. E para adquiri-lo, têm de participar de algum tipo de exercício cuja função é produzir competência, como o estudo das plataformas partidárias ou reuniões num fórum deliberativo. Esse sistema pode, na prática, sofrer com o abuso ou com a corrupção. Mas, respondem os epistocratas, isso também ocorre com a democracia. Para os epistocratas, a questão é saber qual dos sistemas funciona melhor, i.e., produz, no cômputo geral, os melhores resultados ou os resultados substancialmente mais justos.

Uma resposta deontológica importante à epistocracia é que ela pode ser incompatível com o liberalismo da razão pública (Estlund 2007). Os liberais da razão pública sustentam que uma distribuição de poder político coercivo só é legítima e dotada de autoridade se todas as pessoas razoáveis sujeitas a esse poder tiverem razões suficientemente fortes para apoiar uma justificação em favor desse arranjo (Vallier e D’Agostino 2013). Por definição, a epistocracia concede a alguns cidadãos mais poder do que a outros com o argumento de que os primeiros têm mais conhecimento a respeito das ciências sociais relevantes. Porém, prossegue a objeção, se as pessoas razoáveis podem discordar sobre o que conta como especialista e sobre quem são os especialistas, a epistocracia distribui o poder político segundo termos que nem todas as pessoas razoáveis têm razões conclusivas para apoiar. A epistocracia, portanto, distribui o poder político segundo termos que nem todas as pessoas razoáveis têm razões conclusivas para aceitar (Ver, porém, Mulligan 2015).

Jason Brennan

Bibliografia

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ISSN 1749-8457